Meu monstro herói!

Ao acordar essa manhã procurei minha mãe, exausto pelo sonho que tive. Havia corrido mais em minha fértil imaginação, que jamais correrá com as próprias pernas. Eram comigo seis rapazes, dois eu conhecia, os outros três nunca tinha visto antes, ao menos não em vida.

Corríamos como maratonistas de uma fumaça negra, que eu supunha ser um tornado, ou qualquer outro elemento do gênero, porém conforme os segundos passavam aquilo que nos perseguia tomava forma humana, ou na realidade quase isso.

O homem corajoso que meu ser possuía aos poucos ia se esvaindo, e não sei se por traumas de infância ou mera fantasia, simplesmente o rosto daquela criatura tornava-se rugoso e carrancudo como o de meu pai, cada olhar que eu dirigia a ela congelava meu intimo, em contrapartida minhas pernas estavam cada vez mais quentes, pois meu passo só acelerava e eu tomava uma distância absurda dos cinco rapazes que assim como eu fugiam.

Aquela figura que agora podia definir como meu pai tinha olhar bravo, odioso, mas algo nele parecia-me triste, e por isso meu medo foi diminuindo ao passo que minha curiosidade sobre seus sentimentos ia aumentando e quanto mais eu lhe olhava, mais dúvidas surgiam sobre suas intenções.

De repente vi meu pai, “como um vento muito forte”, sugar João, um dos rapazes que também corria e que eu conhecia desde jovem, ele foi o primeiro a me oferecer cigarro e desde então ficamos amigos, mesmo obviamente eu não aceitando sua oferta.

Passaram-se mais alguns minutos e meu pai sugou Marcos, outro amigo, que eu conheci desde a infância, mas a rigidez de meu velho fez eu afastar-me dele na adolescência por ele ter optado pelo “mundo das drogas”.

Mais adiante de uma forma abrupta meu pai encobriu e fez desaparecer os outros três que também estavam comigo, eu não entendia o porquê de tanta irá e brutalidade e continuava a correr dele apesar de não ver mais a raiva que habitava em seu rosto.

Meu corpo não agüentava mais, desolado e cansado parei para inspirar e expirar o ar calmamente, aquela fumaça negra já não existia e a imagem que eu conhecia de meu progenitor, ainda triste porém agora branda parou em minha frente e disse: “ filho, toda rigidez e ardor das palavras que usei em tua educação ferem tua alma e também a minha, perdoa se muitas vezes fui rude, mas tudo foi feito para afastá-lo das más companhias, assim como mostrei no sonho a você, eliminando todos que lhe fizeram ou irão ainda fazer algum mal, e os três que você não conhecia ainda, eram os homens que iriam te assaltar após o serviço.”

Emocionado abracei, beijei e acariciei aquele ser humano que um dia eu não entendi, enchi-me de arrependimento e pedi desculpas por todas as incompreensões que tive para com ele enquanto ele ainda vivia fora de meus sonhos, e afastando-me aos poucos agradeci pelo herói que ele mostrará ser.

Ao acabar de contar o sonho minha mãe apertou-me em um abraço longo e forte, e com lágrimas nos olhos falou-me, seu pai antes de morrer pediu que eu contasse a você o amor que ele sentia quando ele se tornasse recíproco, e esse momento aconteceu, “eu amo meu velho”.