Folclore Catarinense: A história de Belebão
O piá chegou da rua numa disparada, esbaforido e, desesperadamente, chamava pela mãe. Parecia estar fugindo de algo muito perigoso ou de alguém muito cruel. E realmente estava! Só que era de um ser criado pela imaginação popular.
Pedro ouviu de sua mãe que ouviu de seus avós histórias de um tal de Belebão. Diziam os mais velhos, em quem o menino muito acreditava, que esse homem levava embora as crianças respondonas, malcriadas, travessas e que não faziam as tarefas. Era o Homem do Saco!
Pedrinho era piá que pertencia aos dois últimos grupos. Vivia com os outros meninos, metido em travessuras pela vizinhança e sempre deixava para fazer as tarefas da escola por lá mesmo, no pátio do colégio, em cima da hora, muito mal feitas e incompletas. Dizia não ter tempo para “essas coisas da chata da professora”. Queria mesmo era brincar enquanto podia e suas aventuras pareciam não ter fim.
Naquela tarde, viu com seus “próprios olhos que a terra a de comer um dia” o homem que mais temia! Belebão vestia-se muito mal; andava sujo, barbudo e com um saco marrom às costas. Era uma figura sinistra e cheia de histórias em torno da sua existência. Sua chegada em um determinado lugar era motivo para mil e um comentários. Uma história se metia em outra quando se tratava de Belebão. Sempre havia um adulto contando com voz de mistério e medo fatos envolvendo crianças misteriosamente desaparecidas quando o “homem do saco” estava na cidade.
Coincidência ou não, sempre que Pedro fazia alguma coisa escondida ou recebia bronca por não fazer as tarefas, ele escutava alguém falar que Belebão estava na área para buscar crianças arteiras. Quando viu aquele homem vagando pelas ruas do bairro, vasculhando as lixeiras e mexendo em coisas estranhas, não teve outra! Saiu em disparada para dentro de casa, berrando pela mãe. Estava certo de que era por ele quem o homem estava buscando.
- Mãeeee! O... O... O homem do saco! Ele... Ele... tá aí na nossa rua!
- Calma, piá! O que aconteceu?
- Eu vi o Belebão, mãe! Eu juro que vi! Ele está lá fora e veio me pegar.
- Ora, mas por que tu achas que ele vai te levar? Tu não és um piá bom? O homem do saco só leva menino travesso.
- Mas é que... O João aprontou e disse que fui eu. Mas eu não fiz nada, mãe! Eu nem passei por perto da casa da dona Severina! Quem chutou a bola foi o João.
- Do que tu tás falando, piá? Que história de bola e dona Severina é essa? Por acaso foram vocês que andaram quebrando as roseiras da mulher? Bem que ela esteve aqui reclamando.
- Não, mãe! Eu não!
- Olha, olha! Bem que me contaram que tinha sido travessura de menino! Agora sei por que o Belebão está na cidade.
Por quê?
- Para levar quem quebrou as roseiras com a bola. Sabes quem fez isso?
- Nã... Não!
- Tem certeza? Quem mente faz xixi na cama!
- Foi o João! Eu vi ele chutar a bola, mas quando entrou no jardim daquela brux... daquela mulher... saímos correndo. Ela é muito malvada, mãe. Acho que Belebão devia levar ela embora, assim dava pra jogar bola na estradinha sem medo.
- Ah, está tudo explicado! Já para o banho! E amanhã não tem futebol na rua com ninguém. Ouviu, mocinho?
- Mas, mãe!
- Sem mas! Anda! Amanhã mesmo vamos conversar com a dona Severina e o senhor irá pedir desculpas e vai fazer algo para ela. Certo? E agora vou lá fora dizer pro Belebão que tu já estás dormindo. Vou te safar hoje, mas outra travessura não será perdoada, viu?
E era assim que a história do homem que levava criancinhas se mantinha na boca das gerações.
Luciane Mari Deschamps