AS CARTAS QUE ESCREVI ANTES DE MORRER II

Hoje consegui voltar a escrever. Estava cansada esses dias, mais do que o habitual... Pela primeira vez, senti o começo da força da infecção tomando meu corpo aos poucos... Eu disse, na outra carta que não tinha medo de morrer, mas eu confesso que há dois dias eu tive...

Nestes dias, tive uma noite ruim...Geralmente durmo com dois travesseiros, mas estou com cinco travesseiros, pois o quanto mais eu ficar inclinada, melhor é. Passei esses dias com febre e um pouco de dor de cabeça, além disso, sinto que tudo que está acima de meus ombros dói...

Enfim... tive uma noite ruim... Acordei às 4 horas da manhã e não sabia como me posicionar, se deveria ficar mais ereta, se deveria ficar totalmente inclinada, e sentia que estava com febre, que minha boca internamente estava com muito calor, gengivas doíam... Acordei muito indisposta e ainda com febre, mas caí nesta vida que me esperava, por que eu já decidi e não irei morrer antes da hora, não antes de realmente ter morrido, assim, levarei até o último momento todas as minhas tarefas habituais. Tive dificuldades para engolir, não comi direito.

A razão que me faz sentir tristeza é que minha vida estava seguindo um caminho que era o que eu desejava que fosse adiante e, neste momento, serei retirada. Engraçado, não?

Eu não entendo...

Escolhi fazer as cartas para que aqui eu pudesse registrar meu pensamento e sentimentos durante essa metamorfose, durante esse momento que bem mais do que as feridas chagadas internamente, os cabelos caídos, e tudo o mais que começa a me acontecer, é o momento que meus sentimentos procuram uma nova posição no espaço...São nesses momentos que se deseja que exista vida após a morte, porque é imensamente triste saber que morrer é o fim.

Eu pensei que eu pudesse escrever essas cartas por muito tempo antes de morrer, mas o corpo vai se debilitando e me deixando muito cansada, o que me leva a crer que talvez eu venha a escrever com minhas próprias mãos somente por mais um ou dois meses. Logo mais, ditarei estas cartas para que minha sobrinha ou uma amiga possam escrevê-las, isso, se eu conseguir falar...ou seja, antes mesmo da minha iminente morte, não poderei mais produzir...

Esta carta está longe do modo que eu desejava que ela fosse escrita, mas estou com a garganta doendo e cansada...

Se sobreviver, amanhã voltarei.

Eliane Vale
Enviado por Eliane Vale em 11/10/2012
Reeditado em 11/10/2012
Código do texto: T3927121
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