Afogo-me de amar-te
Tudo acendia novamente. Aquela velha e e conhecida sensação de euforia interna, onde os olhos piscam mais rápido, o pulsar é mais latente, e aqui por dentro, bem no fundo, a gente sente quase um aconchego.
De novo a gente vai se permitindo, mesmo que relutante, entregarmo-nos à uma essência qualquer. E, aos poucos, bem aos poucos, bem aos suspiros, bem aos devaneios que insistimos em negar, vamos permitindo essa besteira de suspiros mais fundos e mãos que se apertam na angústia desenfreada de querer mas não pertencer.
Ah minha menina, mal sabe você como me sinto. Mal sabe quantas letras e canções te renego em voz alta, mas em silêncio, em solidão, me assumo berrante, gritante: te consumo, te almejo, te devoro com palavras de querer-te e amar-te e usufruir de sua essência doce. E sua calmaria que me equilibra a euforia, e seus olhos viajantes e sua liberdade de nunca me ser.
Mas, quando a realidade da sua liberdade me atinge, me percebo tão assustadoramente distante e ausente e borrada na sua vida. Porque ter amor não me faz amor. E dar amor não me faz digna do ser amável. Porque eu não te amo! Eu te preciso, eu te admiro, eu te desejo na mais pura ânsia de desejar-te. Porque não te amo, mas destroço-me em grandes e pequenas, ínfimas, quase migalhas, partes do meu eu quando me percebo na sua ausência.
Eu me repito todos os dias que não é, não pode ser amor. Porque mantenho distante. Porque mantenho ausente. Porque não sei ser e ter e querer amor, e, ainda assim, continuar a ser quem sou, ou quem acho que sou. Porque amor rouba a essência, porque amor rouba-me de mim e me deixa a esmo. Pairando na mais absoluta falta de ser.
Não pode ser amor, porque amor de um não se faz, e meu amor de dois não se rende.
Repito-me, minha menina, "deixa que ela fuja com toda a liberdade que ela detém". Foge, menina, foge e leva tua alma cantante e sussurrante pra longe de mim, pois não me suporto amando-te. Não me suporto sobrevivendo nessa minha descostura de você. Pois, se um dia eu ousasse dizer-te, pronunciar-te meu âmago precisante de ti, eu morreria nas minhas próprias palavras. Me perderia, me doaria tão essencialmente a ti, que nada mais me restaria senão viver-te, mesmo na distância do nosso ser.
Porque eu não sei, menina, não sei ser a pessoa da vida de alguém... nem da minha própria.