Meu pai e o leite

Moravamos no bairro de Vila Guilherme em São Paulo. Meu pai , minha mãe e seis filhos.

Todo dia era a mesma coisa,meu pai trabalhava em uma metalurgica a uns 10 quarteirões de casa, e alguem tinha que levar o almoço para o meu pai e sempre era eu quem levava,quando chegava lá, meu pai já estava na porta me esperando, pedia sua benção e ficava olhando prá ele, esperando memandar ir numa venda ali pertinho comprar algum doce para mim e mandava eu marcar na conta dele,isto não era todo dia, pois a situação nossa era difícil,pagavamos aluguel.

E assim eu fazia, a venda era ali pertinho da firma, ia lá pegava um doce ou balas e agradecia ao seu Manoel que era o dono e ia ao encontro do meu pai que me entregava escondido dos patrões um litro de leite.

Aquele litro de leite que a firma dava para os funcionários era para eles tomarem durante o dia no serviço por causa dos produtos quimícos e do cheiro que ficava no ar que inalavam durante o dia.

Meu pai não bebia o leite porque pensava nos filhos em casa que não tinham o leite para beber e eramos em seis crianças.

E assim foi durante muitos anos, lembro que minha maior felicidade era quando eu ia levar o almoço para ele e ele dizia que eu podia pegar um chocolate, era minha maior alegria, porque chocolate era doce de gente rica não era qualquer um que podia comprar e pelo menos uma vez por mês eu podia comprar um e minha alegria era tante que meu pai olhava pra mim sorrindo e parece que ele chegava a salivar de ver minha felicidade por causa de um doce.

E assim o tempo passou, crescemos, eu me casei meu pai se separaram, ele se mudou para Carlópolis , uma cidade pequena no pará, e foi ficando muito doente, contraiu uma doença grave no estomago e só ai é que a gente pode entender que se o meu pai tivesse tomado aquele leite que ele dava escondido para a gente trazer para casa e beber êle teria mais anos de vida, mas por amor aos filhos ele morreu muito cedo.Hoje eu entendo porque a gente é que tinha que levar o almoço para êle. Ele não podia sair da firma com o litro de leite e assim a gente indo lá êle colocava embrulhado num jornal e mandava junto com a vasilha de comida para trazermos para casa, o tempo que eu tinha de levar,era o mesmo tempo de êle vir almoçar em casa, sentar e comer sossegado mas não ia trazer o leite.

Só o tempo fez a gente entender que um gesto tão humildo do meu pai mostra o grande amor que êle tinha por nós, tenho tantas saudades dêle que quando quero fecho os olhos e sinto o cheiro da mão dêle e parece que o vejo me entregando a marmitinha dele com o litro de

leite.

Iolanda Convento
Enviado por Iolanda Convento em 12/09/2012
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