Propaganda enganosa
 
 
     Bernadete estava se correspondendo com Rodolfo pela internet. Havia semanas que estavam no maior bate papo e sentiam-se atraídos. Resolveram se conhecer pessoalmente, pois até então se conheciam por meio de fotos. Rodolfo já falava até em casamento, mas Bernadete não queria assumir compromisso conhecendo o pretendente apenas virtualmente. Mesmo que morassem em cidades muito distantes, ela, de Uberaba em Minas Gerais, e ele, de Anápolis em Goiás, estavam dispostos a marcar um encontro.
   Bernadete tinha algumas preocupações: teria ele algumas manias insuportáveis ou hábitos não muito agradáveis? Ela resolveu submetê-lo a um questionário, antes que combinassem quando e como se encontrariam.
     - Rodolfo, você tem chulé?
     - Não. Eu uso Tênys-pé Baruel.
     - Você tem cheiro forte nas axilas?
     - Não. Eu uso desodorante Très Marchand.
     - Você tem mau hálito.
     - Não. Eu uso creme dental Colgate.
     - Você toma banho diariamente?
     - Sim. Eu uso sabonete Protex.
     - Você costuma trocar as cuecas todos os dias?
     - Sim. E eu só uso cuecas Zorba.
     - Você tem mania de arrotar após as refeições?
   - Não, porque eu não me alimento com comidas pesadas e nem condimentadas. Sou praticamente um vegetariano.
     - Você bebe?
     - Não. Nunca tomei um copo de cerveja na vida.
     - Você solta muito “pum”?
     - Não. Sou muito educado.
     - Você costuma sair para jantar?
     - Não. Os restaurantes são caros. Não gasto dinheiro à toa.
   - Você costuma presentear seus amigos e a namorada em datas especiais?
    - Nos amigos dou um abraço, e para a namorada compro bombons. Mulher adora chocolate, não é mesmo?
     -  E quantas namoradas você já teve?
    - Nenhuma. Conheci algumas garotas, mas nunca tive nada sério com elas. Acho que estava esperando que você aparecesse. Você é a garota mais especial que já surgiu em minha vida.
     - Você costuma ir ao cinema?
    - Não. Acho preferível alugar DVD e assistir em casa. No cinema, as pessoas ficam cochichando e fazendo aquele barulhinho chato de saco de pipocas.
     - Você torce para algum time de futebol?
     - Sim. Sou Cruzeiro doente.
     - Você ronca enquanto dorme?
     - Que nada! Tenho um sono muito suave e tranquilo.
     - Você costuma sair com os amigos para pescar ou jogar uma pelada?
     - Não. Eu sou muito caseiro.
     - Que tipo de música você curte?
   - Ah, eu adoro música clássica! Gosto de ouvir bem baixinho para relaxar.
     - Você tem certeza de que está pensando em me pedir em casamento?
     - Sim. Estou pensando seriamente!
     - E eu estou pensando seriamente em dizer NÃO!
     - Por quê?
     - Porque você é o maior mentiroso que já conheci.
     - Como você pode dizer isso se nem me conhece direito?
     - Meu querido, um homem que diz que não tem chulé, que não arrota, que não faz pum, que não bebe, que não ronca, que não sai com os amigos para pescar e jogar uma bolinha, só pode estar mentindo! É muita cara de pau você dizer que não toma cerveja e que é praticamente vegetariano se, em uma de suas fotos, está com uma latinha de Skol na mão num churrasco com os amigos.
     - Eu estava segurando a latinha para o meu amigo.
    - Ah, conta outra! E tem mais: as coisas que deveria fazer, disse que não faz, que é ir jantar fora, comprar um bom presente para a namorada, ir ao cinema! Pelo visto, você é um pão-duro.  Disse que torce para o Cruzeiro porque sabe que sou cruzeirense. Gosta de música clássica?! Me engana que eu gosto! Sei que você curte mesmo é uma balada sertaneja. Você mesmo já me confessou uma vez. Eu não esqueci, não! Agora, a pior de todas, dizer que nunca teve namorada, que sou a garota mais especial de sua vida? Vamos combinar o seguinte: deixe tudo como está. Fique aí do outro lado da tela e eu fico aqui quieta na minha. Se você acredita que vai me conquistar fazendo propaganda enganosa, tenha certeza de que eu não compro sua imagem.
        E assim, Bernadete deletou Rodolfo, mas não perdeu a esperança de encontrar um cara que assuma seus defeitos, porque sabemos que perfeição não existe. No mundo virtual pode até parecer que sim, mas no mundo real todos nós somos imperfeitos.
 
 
 
 
 
 
 
 
Jorgenete Pereira Coelho
Enviado por Jorgenete Pereira Coelho em 21/08/2012
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