Uma Nonna muito querida
Fui agraciada com um passeio pelos meus compadres Tarcísio e Denise. Fomos pra Rodeio, ali perto de Blumenau. O sol lindo demais pinçou todas as nuvenzinhas e nos presenteou com um céu azul espetacular.
Logo que chegamos fomos recebidos pelos parentes deles, os Furlani. Entrei na casa, e nonna Regina foi logo me contando das coisas de seus pais e avós, imigrantes que atravessaram os mares em 1875.
- Minha nonna Luiza e meu nonno Piero Valle tiveram de voltar pro Trento e Marieta foi junto com os pais, quando tinha apenas 6 anos. Depois, aos 13 anos retornou a essa terra (Rodeio) onde nasceu. Foi preciso enfrentar as intempéries do mar bravio pra não perder a herança que tinha lá – me disse. (e eu me perguntava se isto seria mesmo possível... pois era tão dramático viajar de navio naqueles tempos). Nonna Regina me repetiu o mesmo mais uma vez. Fiquei ali sentada perto dela que é muito amorosa e tem um sorriso bem largo. Marieta Valle veio a se casar com Silvio Moser.
Nonna Regina nasceu em 08 de julho de 1915, e nos surpreende com sua lucidez. Casou-se com Alberto Furlani, e tiveram nove filhos: Izabel, Iria Maria, Silvio, Alcides, Ana Maria, Tarcisio, Ivete, Ademar e Isaura. A vida foi muito árdua, mas puderam lhes proporcionar estudo, uma boa cultura e educação, com muita luta e sacrifício.
Marieta, mãe da nonna Regina, aproveitou sabiamente sua estadia em terras trentinas. Nesse tempo que permaneceu por lá conseguiu adiantar seus estudos, tanto que ao retornar pra Rodeio, o seu conhecimento era tal que a própria professora da escola primária a designou como auxiliar por seu elevado nível cultural. Ainda adolescente ministrava aulas de corte e costura, cujo ofício trouxe na bagagem da Itália.
Umas das curiosidades pra nós aqui, era que, como lá caía neve, fazia-se necessário sempre sair de sombrinha no frio inverno do norte, pois não tinha outra forma de se proteger daqueles floquinhos brancos gelados. Essa recordação é recorrente nas conversas da nonna Regina... ela relembra docemente de seus pais. E ficamos ali com as imagens de sua mãe, seu pai e seus avós (em nossas mentes) encolhidos em capotes e mantas, sombrinha na mão, em meio à brancura das montanhas que até hoje emolduram as paisagens de Vigolo Vattaro, ao norte da cidade de Trento na Itália.
Eu me indagava como conseguiam os calçados, e soube então, que naquela época se conseguia couro facilmente, pois matavam animais pra consumo, daí o couro era aproveitado e levado pro sapateiro da localidade. A pessoa ia até a sapataria onde eram tiradas as suas medidas, e assim, o sapateiro fazia os calçados por encomenda. Coisa muito necessária em dias especialmente frios, e imagine na neve!
Seu nonno Nicolla Moser era muito sábio, me disse, sabia de tantas coisas, que só podia ser obra de Deus; ele veio quando era tudo mata, uma densa floresta ali em Rodeio, lutou muito, fez serviço de carpinteiro, era exímio profissional, e construiu casa, fez estrada. Uma das primeiras construções de Rodeio, em 1876, foi a capela Nossa Senhora das Dores, também conhecida como “Madona Dolorata”, feita em parceria dos amigos imigrantes: nonno Nicolla, Sr. Furlani, Sr. Valle, Sr. Moser, Sr. Valler, Sr. Sardagna, Sr.Tomelin, entre outros. Hoje, ainda está lá, erguida na colina. Com orgulho ela me falou que seu pai trouxe uma Bíblia lá do Trento, e a lia para a família, muito católica, que costumeiramente se reunia.
Os pioneiros desbravadores, avós de nonna Regina, Nicolla Moser e família , e Piero Valle, nascidos em Fornace-Trento, vieram no mesmo navio que trouxe a Madre Paulina e sua família. Também veio de lá, e no mesmo navio, Giocome Furlani, pai de Alberto Furlani (avô do Tarcísio). Eram tempos onde a cooperação mútua na construção de uma nova vila foi imperativo. Por isso, segundo a nonna, eles iam abrindo caminho e pousavam uma semana num lugar, depois abriam mais caminhos no meio da densa floresta, pousavam uns quinze dias mais adiante, e assim foram em frente até chegar ao seu destino: Rodeio. Este percurso foi margeando o rio Itajaí-Açú pela necessidade de água e pela presença de índios nas terras (que os amedrontavam). Os índios foram se afastando para oeste, Ibirima, onde até hoje se encontra uma Reserva Indígena.
A História da Imigração é tão significativa que mantê-la viva é imperativo. Os netos dos que emigraram pra estas terras estão partindo pra uma outra vida. Busco os remanescentes que ainda carregam as lembranças e relíquias de um tempo difícil. O Sr. Alberto Furlani se foi há 36 anos. Tornou-se raro achar netos dos imigrantes, daquela grande leva que veio no final do século XIX, assim como nonna Regina. Apesar de Rodeio ter pertencido à Colônia Blumenau na época da imigração, e eles terem algum suporte por parte dos colegas germânicos, ainda assim, muitos nem querem relembrar das tantas agruras porque passaram. Uns se foram, outros perderam a lucidez, e outros ainda desaparecem sem deixar pistas.
No livro de Renzo Maria Grosselli: “Vencer ou Morrer- Camponeses Trentinos (Vênetos e Lombardos) nas florestas brasileiras”, constam os nomes de cada um desses corajosos imigrantes que vieram de: Vigolo Vattaro, Rovereto, Pérgine, Fornace, Civezzano e Lévico, todos de Trento (pertencia então ao Império Austro-Húngaro), estes que se instalaram em Rodeio, com os respectivos lotes de terra. No compêndio, fruto de grande pesquisa, consta as centenas de famílias que imigraram para o Brasil.
Toda a família se reuniu no último dia 08 de julho pra festejar os 97 anos de nonna Regina. Muita saúde a essa adorável senhora!
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Izabella Pavesi
Fui agraciada com um passeio pelos meus compadres Tarcísio e Denise. Fomos pra Rodeio, ali perto de Blumenau. O sol lindo demais pinçou todas as nuvenzinhas e nos presenteou com um céu azul espetacular.
Logo que chegamos fomos recebidos pelos parentes deles, os Furlani. Entrei na casa, e nonna Regina foi logo me contando das coisas de seus pais e avós, imigrantes que atravessaram os mares em 1875.
- Minha nonna Luiza e meu nonno Piero Valle tiveram de voltar pro Trento e Marieta foi junto com os pais, quando tinha apenas 6 anos. Depois, aos 13 anos retornou a essa terra (Rodeio) onde nasceu. Foi preciso enfrentar as intempéries do mar bravio pra não perder a herança que tinha lá – me disse. (e eu me perguntava se isto seria mesmo possível... pois era tão dramático viajar de navio naqueles tempos). Nonna Regina me repetiu o mesmo mais uma vez. Fiquei ali sentada perto dela que é muito amorosa e tem um sorriso bem largo. Marieta Valle veio a se casar com Silvio Moser.
Nonna Regina nasceu em 08 de julho de 1915, e nos surpreende com sua lucidez. Casou-se com Alberto Furlani, e tiveram nove filhos: Izabel, Iria Maria, Silvio, Alcides, Ana Maria, Tarcisio, Ivete, Ademar e Isaura. A vida foi muito árdua, mas puderam lhes proporcionar estudo, uma boa cultura e educação, com muita luta e sacrifício.
Marieta, mãe da nonna Regina, aproveitou sabiamente sua estadia em terras trentinas. Nesse tempo que permaneceu por lá conseguiu adiantar seus estudos, tanto que ao retornar pra Rodeio, o seu conhecimento era tal que a própria professora da escola primária a designou como auxiliar por seu elevado nível cultural. Ainda adolescente ministrava aulas de corte e costura, cujo ofício trouxe na bagagem da Itália.
Umas das curiosidades pra nós aqui, era que, como lá caía neve, fazia-se necessário sempre sair de sombrinha no frio inverno do norte, pois não tinha outra forma de se proteger daqueles floquinhos brancos gelados. Essa recordação é recorrente nas conversas da nonna Regina... ela relembra docemente de seus pais. E ficamos ali com as imagens de sua mãe, seu pai e seus avós (em nossas mentes) encolhidos em capotes e mantas, sombrinha na mão, em meio à brancura das montanhas que até hoje emolduram as paisagens de Vigolo Vattaro, ao norte da cidade de Trento na Itália.
Eu me indagava como conseguiam os calçados, e soube então, que naquela época se conseguia couro facilmente, pois matavam animais pra consumo, daí o couro era aproveitado e levado pro sapateiro da localidade. A pessoa ia até a sapataria onde eram tiradas as suas medidas, e assim, o sapateiro fazia os calçados por encomenda. Coisa muito necessária em dias especialmente frios, e imagine na neve!
Seu nonno Nicolla Moser era muito sábio, me disse, sabia de tantas coisas, que só podia ser obra de Deus; ele veio quando era tudo mata, uma densa floresta ali em Rodeio, lutou muito, fez serviço de carpinteiro, era exímio profissional, e construiu casa, fez estrada. Uma das primeiras construções de Rodeio, em 1876, foi a capela Nossa Senhora das Dores, também conhecida como “Madona Dolorata”, feita em parceria dos amigos imigrantes: nonno Nicolla, Sr. Furlani, Sr. Valle, Sr. Moser, Sr. Valler, Sr. Sardagna, Sr.Tomelin, entre outros. Hoje, ainda está lá, erguida na colina. Com orgulho ela me falou que seu pai trouxe uma Bíblia lá do Trento, e a lia para a família, muito católica, que costumeiramente se reunia.
Os pioneiros desbravadores, avós de nonna Regina, Nicolla Moser e família , e Piero Valle, nascidos em Fornace-Trento, vieram no mesmo navio que trouxe a Madre Paulina e sua família. Também veio de lá, e no mesmo navio, Giocome Furlani, pai de Alberto Furlani (avô do Tarcísio). Eram tempos onde a cooperação mútua na construção de uma nova vila foi imperativo. Por isso, segundo a nonna, eles iam abrindo caminho e pousavam uma semana num lugar, depois abriam mais caminhos no meio da densa floresta, pousavam uns quinze dias mais adiante, e assim foram em frente até chegar ao seu destino: Rodeio. Este percurso foi margeando o rio Itajaí-Açú pela necessidade de água e pela presença de índios nas terras (que os amedrontavam). Os índios foram se afastando para oeste, Ibirima, onde até hoje se encontra uma Reserva Indígena.
A História da Imigração é tão significativa que mantê-la viva é imperativo. Os netos dos que emigraram pra estas terras estão partindo pra uma outra vida. Busco os remanescentes que ainda carregam as lembranças e relíquias de um tempo difícil. O Sr. Alberto Furlani se foi há 36 anos. Tornou-se raro achar netos dos imigrantes, daquela grande leva que veio no final do século XIX, assim como nonna Regina. Apesar de Rodeio ter pertencido à Colônia Blumenau na época da imigração, e eles terem algum suporte por parte dos colegas germânicos, ainda assim, muitos nem querem relembrar das tantas agruras porque passaram. Uns se foram, outros perderam a lucidez, e outros ainda desaparecem sem deixar pistas.
No livro de Renzo Maria Grosselli: “Vencer ou Morrer- Camponeses Trentinos (Vênetos e Lombardos) nas florestas brasileiras”, constam os nomes de cada um desses corajosos imigrantes que vieram de: Vigolo Vattaro, Rovereto, Pérgine, Fornace, Civezzano e Lévico, todos de Trento (pertencia então ao Império Austro-Húngaro), estes que se instalaram em Rodeio, com os respectivos lotes de terra. No compêndio, fruto de grande pesquisa, consta as centenas de famílias que imigraram para o Brasil.
Toda a família se reuniu no último dia 08 de julho pra festejar os 97 anos de nonna Regina. Muita saúde a essa adorável senhora!
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Izabella Pavesi