Balanço

Balanço. Sempre gostei de balanços. Quando criança eu insistia até que meu avó tirasse o fusca branco, clássico, da garagem poeirenta e me levasse até a minha pracinha favorita para que eu pudesse andar de balanço. Acho que foi por isso que um dia ele pegou um par de estribos usados em celas, um pedaço de madeira retangular e alguns metros de corda e fez um balanço só meu. Para que eu pudesse usar o tempo todo em casa. Pendurávamos ele na garagem. Usei até puírem as cordas, apodrecer a madeira e se soltarem os estribos. Porém a pracinha era ritual quase diário; às vezes, não desistia dela. E o vô e a vó sempre faziam todas as minhas vontades.

Meu vô, era um avô muito bacana, me criou como neta-filha. Eu ficava com meus avós todos os dias, o tempo inteiro, quando não estava na escola, lá estava eu com o vô e a vó. Tomando chimarrão no final de tarde sentada em frente à casa, ou enfiada na rede ou no balanço.

O vô era engraçado. Quando eu ficava andando de bicicleta até tarde na rua sem asfalto, ele se sentava no pátio para me cuidar. Naquela época a rua não era muito movimentada. Ele sentava na sua “poltrona da rua” e deixava o 38 preso à cintura. Todos respeitavam aquele velhinho de 60 e poucos anos. Se pediam fogo pra acender o cigarro ele mostrava o 38. Era engraçado ver as pessoas correndo e rindo depois do susto.

Toda vez que vejo um balanço eu sento e me embalo forte. Sempre me lembro do meu avô, com seu palheiro fedido, o bigode branco meio amarelado, com suas camisas de mangas curtas sempre bem passadas e as calças de alfaiataria que minha vó mesma fazia pra ele. E do boné, não posso esquecer do boné!

O meu pai-avô faz muita falta lá em casa. Pena meu irmão não tê-lo conhecido, nem a vó. Ele não teve a mesma sorte que eu. De brincar subindo na goiabeira gigante que tínhamos no pátio e de ver meu avô subindo nela para pegar goiabas para mim. Queria ter podido ter mais tempo com eles.

Agora lá não tem mais a rua sem asfalto, a garagem poeirenta, o fusca branco e clássico, nem a melhor goiabeira da rua. Mas o mais triste de tudo, lá em casa não tem mais o vô com suas invenções de Professor Pardal e nem a vó com seu sagu feito com vinho da colônia. Eles embarcaram num trem com destino às estrelas há muitos anos.

Lilith Góthica
Enviado por Lilith Góthica em 01/08/2012
Código do texto: T3808714
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