O QUINTAL
As crianças desapareceram do quintal, foram levadas uma a uma pela vida, cada uma seguiu seu próprio caminho, ficaram as vozes e os risos das brincadeiras, que ainda ecoam nas lembranças que pintam as portas e as janelas de verde, de ilusão. No quintal ainda existe o catavento, a bomba d’água manual, que não bombeia mais água para saciar a sede das crianças no quintal. As portas e janelas verdes da casinha branca foram abertas uma a uma , ainda no nascer do dia, o homem com seus setenta e poucos anos saiu pela porta da frente, respirou o ar puro, caminhou até a bomba d’água manual, bombeou a água, lavou o rosto, saciou sua sede, olhou o catavento que se movia, sentiu o vento no rosto como se estivesse catando o vento assim como o catavento e como todas as manhãs atravessou o quintal e seguiu até uma árvore que ficava quase na subida do morro, onde nascia o pequeno riacho que passava lá no fundo do quintal, chegou à árvore, onde embaixo era a morada de sua esposa que se foi há álbum tempo, ajoelhou-se e orou como em todas as manhãs.
- Sinto saudades de você – murmurou baixinho
Sentiu o vento tocar seu rosto como se o beijasse, levantou, fez o sinal da cruz e voltou lentamente para casa, parou novamente na bomba d’água manual, que não bombeava mais água para matar a sede das crianças no quintal, matava a sede apenas de quem ficou sozinho catando o vento catado pelo catavento no quintal, que ficava muito além de qualquer litoral, bebeu água sendo observado pelos pássaros que estavam nas árvores ilustrando a manhã de sol, pintando de natureza o pequeno quintal. O homem que era observado pelos pássaros entrou na casinha branca com portas e janelas verdes, que estavam abertas, caminhou até a sala, pegou a espingarda de caça, que a muito tempo não pegava, havia muito tempo que não caçava, sentou no sofá com a espingarda e sentiu o cheiro da mata que observava pela janela. Lá fora os pássaros sobre as árvores fizeram silêncio quando sentiram as portas e janelas verdes da casa serem fechadas, ouviram o silêncio que vinha de dentro da casa, ouviram o vento pelas frestas entrar na casa, de repente partiram em revoada, todos de uma só vez, quando ouviram o grito da espingarda que ecoou em todos os cômodos da casa.
Arnoldo Pimentel