Com amor, à felicidade da moça.
Encontrei-a sentada numa mesa de madeiras escuras, as pernas delicadamente cruzadas e um olhar vago, olhos claros que aparentemente olhavam mas nada viam. No rosto de boneca, a expressão de quem segurava um choro constante pelas injustiças malditas da vida complicada naquela cidade quente e monótona. Como não percebesse minha presença, sentei ao lado dela. Ouvi aquele coração miúdo que batia cansado atrás do seio esquerdo. Coração que me contava todo o filme que se passava então naquela cabeça de adolescente que amadurecera precocemente. Depois de tanto choro, tanta decepção e tanto recomeço, ela se mantinha inteira. Tinha que se manter inteira, forte, era o que dizia. Eu confesso que queria sacudi-la ali, focar seus olhos, abraçá-la e dizer que tudo bem menina, a vida não é justa mas teu coração batendo e teu sorriso aberto fazem o mundo mais bonito. Mas não levantei, não sacudi, fiquei quieto observando, tomei-lhe a mão e apenas fiquei ali com ela. Algumas pessoas precisam de dinheiro e roupas de marca, mas ela, tudo que precisava, era de alguém pra ficar junto. Depois de um tempo, algumas lágrimas vieram e finalmente ela virou-se pra mim. Contou tudo sobre tudo e reclamou até sobre sua inteira inutilidade por não saber sequer embrulhar um presente. Moça tola, tinha feito um embrulho no meu coração, com laço fita e tudo, dos mais belos! Ai se ela soubesse… Eu contive outra vez o impulso de chacoalhar aquele universo lindo que era ela. Eu também era fraco, e eu quis chorar também porque senti a injustiça daquilo tudo pesando até em mim. Ela chorava por alguém, eu chorava por ela. Porque o maldito ser humano que roubara o coração daquela princesa sem castelo não via tudo o que eu via? Porque ele não conseguia simplesmente amá-la da maneira que ela indiscutivelmente merecia? Eu que nunca fui Deus nem mago, não sabia muito o que fazer. Levantamos da mesa, segurei forte sua mão, e prometi pra mim que eu faria até o impossível pra vê-la sempre melhor. Era injusto vê-la chorar, mas era mais injusto ainda o mundo não ver aquele sorriso que ela guardava. Que ele roubara. E fomos embora dali. Ela ora triste, ora feliz, sempre tão nos extremos. Eu rezando. Pela felicidade. Dela, dele, minha. Felicidade pra preencher os buracos que a vida fez em nós, e faz em todo mundo. Felicidade pra vê-la sorrir e brilhar, como nos contos de fadas. Felizes para sempre e o rosto daquela moça, era nisso que eu pensava todas as vezes que fechava os olhos. E penso, até hoje. Não esqueço da doce menina com as pernas delicadamente cruzadas. Quando a vi, eu soube, não era do tipo que passa por alguém sem deixar um pouco de si… Talvez por deixar tanto de si onde não deveria, faltou pedaço em si, faltou acerto. E foi por isso que dei a ela meus restos mais doces, porque o amargo não a agrada. Mulher de fases, menina tão medrosa e de repente segura, sem meio-termo, eu só espero que o sorriso perdure, que nas faltas eu não lhe falte, que no meio da tristeza haja sempre um vestígio de ser feliz. Pra sempre.