Portal Sonho
Quantos degraus preciso subir para encontrar a felicidade? Essa pergunta sempre intrigou Isaque, afinal o seu nome significava riso, porém ele era uma criança triste, solitária, mas cheia de sonhos. Ah isso ele tinha de sobra! O menino vivia com a tia Ordália, que reclamava sempre da vida e até do nome. Ela se apresentava como Natália e era cheia de manias estranhas: molhava os pés antes de entrar em casa e pedia o Isaque para enxugar o chão, depois saia derrubando o que via pela frente e não lhe agradava como vasos de flores, livros e tudo o que era colorido. Ela não tinha filhos, marido, amigos e a pessoa mais próxima dela era o sobrinho.
Isaque começou a observar a tia e estava certo de que se queria ser feliz, teria que buscar por si mesmo, pois se dependesse de Ordália... Os olhos do menino se abriram quando um vendedor ambulante de livros chegou a sua casa e lhe apresentou uma coleção intitulada “Sonhos“. Ele não tinha dinheiro para comprar nada, mas queria tanto o livro que pediu emprestado para o vendedor. Ao ver o brilho que estava estampado no olhar de Isaque, o ambulante cedeu e emprestou o “Portal Sonho” por uma semana. Ele viajou no livro e não largou aquelas páginas até chegar na contra capa, fechou-se no quarto e a tia até pensou que ele estava doente. Em cada linha, ele se alimentava das letras e aprendia alguns passos para alcançar o mundo que sempre sonhou, mas que não sabia ser possível.
Quando Isaque já estava quase terminando a leitura, Ordália resolveu entrar no quarto para ver o que estava acontecendo com o sobrinho. Ele nem notou a presença da tia e continuou sua viagem, até que a tia que detestava livros, arrancou das mãos dele tudo o que importava naquele momento para Isaque. Mas algo estava diferente e surpreendeu a tia. Ao invés de brigar ou ficar chateado com Ordália, ele sorriu. Aquela atitude deixou a tia desconsertada.
- Por que você está rindo menino?
- Sabe aquela pergunta que sempre fazia a você tia?
- Hoje aprendi que o primeiro degrau que precisamos subir para alcançar a felicidade é o perdão, pois do contrário, seremos pessoas sempre rancorosas e sem amor.
Tia Ordália andou de um lado para o outro, pensou, ficou furiosa no primeiro momento, mas depois foi se acalmando, sentou ao lado do sobrinho, o abraçou pela primeira vez e começou a chorar. Ela ficou um longo tempo ali e derramou tantas lágrimas que a camisa de Isaque ficou toda molhada. Depois eles não disseram uma única palavra, mas se olharam e sorriram. Até os raios de sol que entravam pela janela naquele instante pareciam estar mais reluzentes, formando um brilho ao redor dos dois. Depois do abraço e de um silêncio rico em significados, Ordália continuou.
- Sabe, Isaque, tinha raiva de você, porque queria ter um filho e não posso. Sempre guardei ódio no coração pela alegria que sua mãe irradiava, enquanto eu era sempre uma pessoa triste. Agora, vendo você assim, descobri que eu também posso ser feliz e se este livro que você leu lhe ajudou, dou ele de presente a você.
- Tia, não precisa se preocupar, já aprendi com estas páginas e agora vou devolvê-lo para o vendedor ambulante como prometi, assim outras pessoas poderão lê-lo e aprender como eu que o portal da felicidade está no nosso próprio coração e só é alcançado com muito amor.
No outro dia, o vendedor bateu a campainha bem cedo e Isaque correu até a porta eufórico, com muita vontade de agradecer. O ambulante ao ver o sorriso estampado no rosto do menino também sorriu e desde então era sempre assim. Todos os que viam o riso que vinha da alma do menino, aprendiam uma mais sobre a felicidade, que mais que um estado de espírito, é uma busca pelo caminho do amor. E toda essa a alegria traz paz e muita vontade de continuar a sonhar. E desta vez, Isaque acreditava no que sonhava.
Poema de Isaque para tia Ordália
Meu universo era sem cores e sem amores
Vivia em um caminho escuro e triste
Até descobrir que a felicidade existe
E que o sorriso deixa o rosto bonito
E faz com que tudo brilhe em sua volta
E todo aquele rancor reprimido e revolta
Desaparecem quando a alegria de torna rito
Quando não se economizam abraços e carinho
E se aprende que ninguém é feliz sozinho.
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*Brenda Marques Pena é jornalista e escritora. Poemas, crônicas e contos de autoria dela já foram publicados em revistas e livros de editoras de São Paulo, Minas Gerais, Brasília, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Um pouco do trabalho literário e fotográfico de Brenda Marques pode ser encontrado no site www.cautionband.com.br/brenda.htm. E-mail brenda@cautionband.com.br.