NOTURNO

Aos pares ou solitárias, dezenas de janelas iluminadas formam a torre de um prédio mediano e branco, no amarelento escuro citadino. Haverá gente na sala, em frente à TV? Uma pessoa solitária a procura de notícias frescas, de canal em canal? Mas qual, hoje o dia está ruim de notícias.

Apagou-se uma luz – mas será mesmo da sala? – e o jantar está pronto e é sem graça, pois todos os jantares solitários são sem graça. Ainda não tens muita experiência com a solidão, senão saberias que a melhor forma de jantar sozinho é ir ao restaurante: lá todo solitário pode sentir-se a vontade, pois para mudar o canal da TV é preciso pedir ao garçom – o que torna o ato de ver televisão mais confortável.

Outra luz é acesa, possivelmente no quarto. Deve haver algum livro sobre a cama, a espera de ser lido, marcado na página 127. Mas hoje a leitura não avança. É tarde, muito tarde, e eu estou cansado de esperar, sobre o frio parapeito, sob um céu sem estrelas, que a última janela enfim adormeça.