Um bonde para esperança.
Uma chuva caía impiedosa naquela manhã belo-horizontina de Janeiro de 1962. O Rio Arrudas com suas águas que invadiam as ruas do centro. Procurei me abrigar sob a marquise do Prédio da Mesbla, onde cada centímetro era disputado. Preocupava-me a pasta com os papeis da venda de uma casa no bairro Floresta. Naquela hora do dia um comprador em potencial, vindo do interior, me aguardava no local, conforme telegrama. A venda mudaria minha situação difícil naquela cidade.
Mas a chuva cada vez mais rigorosa transbordava por todos os lados e ali, já sentia o perigo da inundação. Mais pessoas chegavam, por ser um ponto próximo da parada dos bondes. Cada um reclamava da necessidade de chegar no horário do trabalho, outros menos ocupados, já se dirigiam para suas visitas à famosa casa de prostituição da Zezé naquele bairro. Vidas se misturavam molhadas sob aquela marquise com desejos e sonhos bem diferenciados.
Quando o bonde surgiu, as pessoas como numa Cruzadas se precipitaram nele com guardas chuvas como armas para "pongar" no bonde. Desarmado do meu, senti impotente e vi o bonde sumir com gente pendurada como roupas em varal. As águas mais próximas do abrigo. Num ímpeto de fúria me atirei na chuva com a pasta enfiada sob o paletó e corri pela chuva, mas não consegui ir além da marquise das Casas Pernambucanas. De lá podia ver o antigo abrigo, com as águas inundando e as pessoas fugindo.
Olhei para o relógio e senti um frio na barriga, pois possivelmente o comprador já teria desistido, pois havia outro imóvel em mente. Ouve-se um barulho vindo antigo abrigo a marquise da Mesbla, desabar sobre algumas pessoas. Uma correria geral, pessoas pisoteadas, corpos caídos na enxurrada. Naquele instante minha fúria e forças foram nas águas e sai calmamente na chuva em direção a minha casa com um pensamento consolador, de que “perdi o bonde e a esperança e volto pálido para casa”, mas com fé renovada de que lá em cima Alguém gosta de mim e me poupou a vida para ainda poder sonhar.
Toninho.
03/06/2012.
Exercicio Nº 1 criar uma historia com base na frase de Drummond:
Perdi o bonde e a esperança, volto pálido para casa.