PANTA - O MINEIRO QUE BOTOU PRÁ CORER OS OFICIAIS DA MARINHA DA CAPITANIA DOS PORTOS

E R A U M A V E Z

O Cenário era na Praça dos Alfonsos, onde o jardim estrela, o mercado de Pedro Almeida instalado no barracão da Codevasf, o mercadão municipal com suas quatro entradas, a barbearia Estrela com seus jogadores de damas, algumas lojas de artigos de confecções e transeuntes, formavam o set da ocorrência de um fato no mínimo inusitado.

Como era de costume aos domingos, Santa Maria da Vitória parecia viver mais um dos dias calmos naquela manhã com um sol brilhando placidamente, enquanto a população seguia sua rotina normal, como ir à missa na igreja Matriz, ir ao culto nas igrejas evangélica, os amantes do rio Corrente como era de praxe, enchiam as praias para o banho matinal aproveitando bem o sol daquela linda manhã. Nas casas, quem era dona de casa, normalmente preparava o almoço. Nos bares e nos botecos, quem era bebum, já bebericava a sua cervejinha gelada, já que os ares da primavera e o sol inspiravam a gandaia matinal.

A rotina da cidade naquele domingo fora quebrada, não pelo simples fato de a Guarda da Capitania dos Portos fazer uma visita de rotina às margens do Corrente, pois essas vindas da sede lá de Bom Jesus da Lapa eram fatos já incorporados à vida dos moradores de Santa Maria mas naquele domingo, justamente naquele domingo, a rotina quebrou –se completamente, principalmente para os mascates que montavam as suas barracas em pleno domingo e os inveterados jogadores de damas, como o meu grande amigo, Cícero de Ferrerinha.

Naquele domingo eu ainda não estava tomando banho no rio, já que as minha tarefas domésticas ainda não estavam concluídas. Indo tranquilamente para o mercadão municipal, passando pelos passeios do Jardim Jacaré olhando tudo que atravessava o meu caminhar, só depois que eu transpus a ponte sobre o riacho é que me vi no meio de duas alas de pessoas curiosas, e, quando me dei conta e me preparava para fazer parte de uma das alas, foi que eu vi os oficiais da capitania dos portos de automáticas em punho dizendo: Cadê aquele safado canalha sem vergonha! Caramba! Pensei enquanto o meu coração disparou afinal de contas, se houvesse um tiroteio naquele momento eu estaria na linha de frente dos tiros já que ao adentrar abruptamente ao centro da ala, eu fiquei frente a frente com os oficiais da Marinha com armas em punho.

Vamos deixar de lado os fatos e vamos a um breve narração sobre o personagem principal do ocorrido. Panta era um mineiro que havia se estabelecido em nossa cidade montando um bar e restaurante à beira do Rio Corrente. Tinha a fama de ser mau. Era do tipo machão com “M” maiúsculo. Até com os filhos e sobrinhos ele era bastante severo. Todos os que o conheciam jamais tentaram desafia – lo. Conta uma lenda que, um certo roceiro defecou nos mictórios do bar. Não havia sanitários no local. O Panta ao notar o que o coitado fez, puxou o revolver, trancou o infeliz dentro do banheiro e disse: Se vire para limpar seu vagabundo! Se não conseguir, coma tudo! E que minutos depois, ao abrir a porta do banheiro estava tudo limpo. Não se sabe o que o coitado fez para limpar. Também não se sabe se tal fato é verdadeiro, mas era a fama semeada pelo mineirinho de bigodes. Só sei que uma coisa eu tinha certeza. As sobrinhas dele eram muito lindas. Agora quem seria o corajoso de cantar uma delas? Certa vez, o Colégio Popular Oliveira Magalhães ficou alvoroçado! Era o Panta que foi à secretaria do Colégio falar com a diretora. Chegou cheio de valentia mas dona Ruth, calejada em ter contatos com todo tipo de gente, experiência adquirida ao longo dos anos, conseguiu que o valentão se acalmasse e acatasse as ordens e ainda saiu agradecendo pelas informações dadas à cerca do filho indisciplinado.

Assim que as coisas ficaram serenadas e os oficiais da Capitania regressaram para Bom Jesus da Lapa através das resenhas, fiquei sabendo que exigiram que todos os donos de bares e pequenos restaurantes fechassem de imediato os esgotos que eram jogados diretamente no rio e Panta, não aceitando as ordens dos oficiais, sacou um revólver que em luta corporal foi tomado pelos oficiais mas em seguida pegou um outro revolver na gaveta e os oficiais surpresos, pois não contavam que houvesse uma segunda arma com o contendor, fugiram rapidamente como cães sarnentos e o rabo entre as pernas e, ao retornarem, fizeram todo aquele teatrinho para não se sentirem desmoralizados, pois naquele 1976,ainda vivíamos em plena ditadura militar.

A história aparentemente estava encerrada. Será? Ledo engano! Era uma bela manha de sexta feira. Muitas pessoas comprando carne nos açougues atrás do mercadão, outras comprando produtos nos inúmeros armarinhos dentro e fora do mercadão. Na entrada esquerda Salvador enquanto vendia os seus produtos contava uma piada entre cobrar as vendas e dar o troco. Tudo na sua devida normalidade naquela manhã.

Ao andarmos pelo lado de fora do mercadão, notamos alguns caipiras usando chapéu de palha e vestindo camisas xadrez. Achamos esquisito os caipiras. Não era festa de São João e também não se enquadravam com os tipos de caipiras da nossa região. Eles andavam pelo mercado sem falar com ninguém. Nem davam bom dia! Caras estranhos diziam alguns. Será que são pernambucanos recém - chegados aqui? Perguntavam outros. Como sempre, eu estava no açougue batendo papo com Bainho, torcedor do Fluminense e vejo Panta sair tranquilamente do barzinho dele e entrar em um outro, que ficava paralelo ao mercadão, para conversar com o dono que era seu amigo. Como um raio que cai em noites de tempestades, os caipiras em numero de sete ou mais, como num passe sincronizado, adentram ao bar, fecham as portas de esteiras abruptamente e começam a seção de pancadarias.

Ao terminarem a pancadaria eles jogam o Panta dentro do bagageiro de um dos Jeeps que apareceram de imediato, e rumam para Bom Jesus da Lapa. Segundo nos informaram, Panta foi vomitando sangue e estava bastante machucado. A Ação do Dr. Hermilton, um dos grandes advogados da nossa cidade e que era amigo do Dr.Eugenio Lyra, foi rápida. Em plena ditadura militar,Dr. Hermilton colocou os oficiais da marinha na parede,já que eles só tinham poder de fiscalização na Capitania dos portos que era em Bom Jesus e não tinham poder de prisão e nem tortura. Dr. Hermilton venceu o processo contra a marinha.

Depois de passar por esta tempestade, o Panta passou a ser uma pessoa mais dócil, mais amável, inclusive com os filhos e sobrinhos.

Digo:Arre égua!!!!