03 (In)Atos
I
Se o chão que piso cedesse, meus pés seriam esfolados nos trilhos até sobrar um toco de osso exalando fumaça fétida, com o tutano escorrendo mansamente. Eu viraria um coágulo no meio da brita, passível da dissolução completa após a primeira garoa. Seria aquele pedaço de carne chamuscada, esbranquiçada após as esparzidas de nitrogênio. Seria uma lembrança - só. Um nada dali 20 anos ou menos, completamente esquecido. Morto. Olvidado. Fim.
II
Não: sou o estremecimento da onça camuflada, excitada na exultação da cogitação da primeira mordida. Lambo as garras. Calculo a distância. Espero. Sou paciente. Com a barriga mais do que cheia, sinto a inutilidade da minha caçada. Um agente da concupiscência: é isso que eu sou.
III
Enfastiado com a confusa torrente de reações orgânicas - ora salientando a minha decadência, ora beijando a minha ascendência à mais vil das categorias de seres humanos bestiais -, suspiro e desvio os olhos.
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30/05/2012 - 23h45m
Pedro The Lion - A Mind of Her Own