**Vergonha na Cara**
Arredio e desconfiado, perdido e sem convicção.
Este foi o homem que cruzou o meu caminhar.
Igual a um cão sem dono, maltrapilho e cheirando mal.
Em seu rosto, a nítida expressão da dor pungente.
Seus olhos negros eram suplicantes.
Aproximou-se de mim, envergonhado ao extremo.
Pediu, se eu poderia lhe pagar um cachorro quente.
Senti que sua fome era muito superior a sua vergonha.
Duas colegas, que estavam ao meu lado trataram de se afastar.
A voz serena e doce...A humildade do seu pedido.
Não combinavam com a aparência daquele homem.
Pedi ao vendedor, que atendesse aquele pedido.
A contra gosto, foi-lhe servido o lanche.
Faminto estava, mas antes de se alimentar, me olhou.
Um sorriso tremendamente belo estampou em sua face.
Disse-me...Não tenho como lhe retribuir este carinho.
Devolvi o sorriso, pasma pelo encanto que tal atitude teve sobre mim.
Ao se afastar, um cachorro o seguiu.
A curiosidade formigou, à vontade de ouvir novamente o som daquela voz e ver aquele sorriso terno, me levou a uma estranha atitude da qual mudaria em muito, meus dias vindouros.
Ele sentado ao meio fio, as colegas me olhando de forma esquisita e eu perdida em meus pensamentos, sobre como deveria agir, ou o que fazer.
Ele dividira seu lanche com o animal e agora se deliciava vagarosamente com o restante do suco que havia no copo e eu não parava de observá-lo, intrigada e brava comigo mesma.
A consciência me enxotava, mas, o meu lado humano prevaleceu. Talvez a curiosidade seja um mal do qual eu padeça.
Comprei mais um cachorro quente e me aproximei do meio fio. O cachorro latiu abanando o rabo e ele se voltou, levantou-se, olhou-me como se pudesse enxergar através de mim. Estagnei, fiquei parada como uma estatua segurando o lanche.
Segundos depois, entreguei-lhe o suco e depois o hot-dog, sem deixar de fitá-lo.
Como se lesse meus pensamentos, as palavras que ouvi, fizeram meu sangue gelar em minhas veias.
Não me envergonho do que sou, tenho vergonha, de onde eu deixei que os outros me levassem. Tenho vergonha de ter sido fraco, de ter deixado o amor, ser meu maior carrasco, me envergonho de ter caído e ter faltado forças para dar a volta por cima.
Doce mulher que, agora sacia a minha fome serei eternamente grato por tal benevolência, porém, vou ensiná-la a respeito de algo que aprendi, pagando um preço muito alto.
Nunca favoreça a alguém, se o favor puder vir a lhe prejudicar...Nunca tire de sua mesa, para alimentar a um estranho...Nunca tente tirar alguém do fundo do poço, se não tiver mais pessoas segurando em suas pernas, pois é mais fácil ele te levar para o fundo, do que você conseguir tirá-lo de onde está.
Não sou boa companhia, mas, não tenha pena de mim, afinal, Deus me fez perfeito.
Em segundos, passaram-se milhões de pensamentos em minha cabeça. Eu trançava os dedos, aflita e desconcertada, sem saber o que fazer, tentando em vão descobrir algo que pudesse ser útil.
Mais uma vez, aquela voz melodiosa se fez ouvir.
Jovem Senhora, não se aflija, pois, o que eu mais preciso, a Senhora não tem a me oferecer.
Mas...Diga-me...Talvez eu possa fazer algo, fale-me do que necessita.
Eu ??? Eu preciso voltar a ter atitude, parar de me lamentar e fazer acontecer...Levantar minha cabeça e recomeçar de onde eu parei...Limpar meu coração, afastar os pensamentos sórdidos e atirar longe a autopiedade e somente assim, conseguirei resgatar a VERGONHA NA CARA, que, não sei em que parte do caminho, eu a perdi. Sorriu melancolicamente e se afastou.
Hoje, penso nos conselhos que me deu, recordo aquele sorriso encantador e me entristeço ao lembrar que...O Amor foi o seu pior Algoz...Vida ingrata...Vida Cruel...Abençoado seja, Homem de Deus, esteja onde estiver...CMRS.