Um amor impossível

A lua já estava alta quando se deu conta do tempo, Michel estava num transe que algumas vezes o pegava, a lua o encantava com seu brilho e seu esplendor. Era noite de lua cheia, o que deixava a lua mais bela ainda.
Michel já nem se lembrava mais há quanto tempo havia mudado sua vida, seus hábitos, mas sabia que não podia mais viver na luz, que havia feito uma escolha para a eternidade.
Sem pensar muito, resolveu sair à caça de seu alimento. Passou por ruas estreitas, becos escuros, lugares sujos que poucos haveriam de estar, mas não desistia de sua busca, afinal seu estômago conversava com ele com uma intensidade que não conseguia mais ignorar.
Encontrou então sua vitima, em uma rua mal iluminada, com janelas e portas fechadas. Ela estava lá, parada, quieta, como se estivesse a esperar por ele. Sem pensar, ele atacou a figura ali parada, agarrou pelos cabelos e em uma mordida alimentou – se do doce sangue daquela criatura. Sugou seu sangue até sentir que seu coração começara a parar, então a largou e partiu sem olhar pra trás.
Mas seu estômago ainda o incomodava, não parava de pedir por mais alimento, sua fome ainda era grande, pois havia dias que não se alimentava, sobrevivia de uma refeição feita há alguns meses e necessitava de mais para se manter bem, então saiu à caça de uma nova vítima.
A encontrou em um parque, vazio, escuro, próxima ao lago que nesse parque havia, ao atacar teve uma surpresa, viu um vulto muito luminoso passar por de trás dele e surpreso com a situação, não prosseguiu com o ataque. Mas seu estômago pedia por mais, queria ser saciado, precisava de mais alimento, então Michel voltou – se novamente para sua vitima e sem pensar atacou – a.
Ao tocar sua vitima, sentiu que uma mão tocou – lhe o ombro impedindo que começasse a se alimentar, virou – se e viu uma linda moça, ruiva, com olhos de um azul que não se podia explicar, uma pele branca, face de anjo, a mulher mais linda que ele já havia visto.
- Não faça isso, por favor – disse ela com uma voz calma e doce.
- Porque não? – indagou Michel com aspereza
- Essa doce criatura não merece a morte, merece sim uma chance de viver.
- E eu como fico? De estômago vazio?
- Procure outro ser, um animal talvez, assim saciará sua fome e não matarás ninguém.
Falando isso Ângela virou as costas e partiu. Michel com peso na consciência não conseguiu terminar seu ataque e partiu também.
Saiu então para curtir a noite e deixou para fazer sua próxima refeição uma outra noite. Foi a boates, a clubes, danceterias, todos os lugares movimentados que conhecia, mas a imagem daquela mulher não lhe saia da cabeça. Quem era a doce mulher que o abortará sem ao menos dizer seu nome? Queria saber mais sobre aquela moça, mas não saberia dizer se iriam se encontrar novamente.
Alguns dias se passaram e a imagem daquela moça ainda não saia de sua cabeça e notou que seu coração havia sido invadido por um sentimento que há séculos ele não vivenciava. Queria um novo encontro, um novo toque, mais não sabia como fazer isso, não tinha sequer o nome daquela criatura.
Voltou a sua caça então, ao passar de um mês, precisava reparar a falta de alimento daquela noite em que vira tal criatura. Saiu à caça e na esperança de reencontra – la.
Andou muito e nada lhe chamava a atenção, decidiu então parar em um parque e deixar que sua vitima se aproximasse. Para sua surpresa Ângela se aproximou devagar, parecendo flutuar e sentou – se ao seu lado.
- Boa noite, Michel – disse ela com voz serena.
- Como sabe meu nome? – disse ele preocupado
- Sei mais do que pode imaginar, mas fique tranqüilo não irei lhe fazer mal.
A imagem dela parecia iluminada, como se não fosse preciso luz para enxerga – la, tudo a sua volta parecia mais belo do que o normal, com uma luz quase divina.
- Porque me procuras, Michel? – indagou ela
- Não te procuro, somente queria saber quem você é.
- Então porque sai à noite em busca de alimento sem se interessar por nada?
- Nada mais me agrada, não sei o que acontece.
- Sei que quer saber mais sobre mim, mas ainda é cedo para saber o que sou ou quem eu sou. O que posso lhe dizer é meu nome.
- Então me diga, por favor.
- Ângela – disse ela olhando em seus olhos e partiu
Michel ficou irado, como uma mulher podia resistir aos seus encantos assim? Nunca em toda sua existência havia sido ignorado dessa forma. Passou então a viver uma contradição, ora sentia – se atraído por Ângela, ora com raiva e ódio de não te – la seduzido.
Michel passou então a mudar sua tática, saia todas as noites a procura de animais para se alimentar, já não atacava humanos e sempre que podia ia ao parque para ver se a encontrava. Com o tempo percebeu que seu coração estava invadido por um imenso amor, queria de qualquer forma reencontrar aquela jovem, mas parecia impossível.
Desconsolado, sentou –se no mais alto dos prédios e observou a lua e como sempre a lua fazia, o encantou sem nenhum capricho. Quando deu por si, aquela doce criatura estava novamente ao seu lado, sorrindo como um anjo.
-Não me procures, Michel. Não posso lhe dar aquilo que tanto deseja.
- Então porque me encantou, porque deixou – me apaixonar?
- Só salvei uma vida de sua fome, não invadi seu coração.
- Mas me tocou... tocou meu coração que há muito tempo não batia por ninguém.
- Vivemos em mundos diferentes, você escolheu uma vida que não posso acompanhar, não pertenço a esse mundo nem ao seu.
- Me diga a que mundo pertences e farei parte dele.
- Não poderás, sua escolha é definitiva e não pode ser mudada por um simples querer. Preciso ir.
- Não vá, me conte mais sobre você. Me conte porque não podemos ficar juntos?
- Uma outra vez quem sabe? Mas peço que me tire de seu coração.
E Ângela partiu mais uma vez deixando Michel desolado, com o coração partido por não poder estar ao lado dela.
Não parava de indagar porque não poderiam viver juntos, porque ela não poderia optar pela mesma vida que ele optou, porque não poderiam ficar juntos?
Mas deixou os dias seguirem na esperança de um reencontro.
Até que sua fome foi maior que suas forças e numa noite atacou uma pessoa que estava às margens de um rio, chorando pela perda de um ente querido e ela mais uma vez intercedeu e não deixou que ele o matasse.
- Não faça isso! – disse ela em um tom alto e forte.
- Porque não? Estou com fome e esse ser está a sofrer – respondeu cinicamente
- Esse ser sofre por ter perdido um amor, mas não merece a morte por isso, um outro está por vir.
- Quem vai me impedir?
- Eu!
E ao falar isso grandes asas brancas surgiram por detrás de Ângela, que se iluminou ainda mais e teve seu ser desvendado.
- Um anjo! Você é um anjo – disse ele desconsolado
- Por isso não posso viver ao seu lado. Amo – te de coração, mas vivemos em mundos opostos.
- Não, não pode ser. Quero você mais que tudo, não pode me deixar assim, Ângela.
- Não tenho o que fazer, não posso deixar meu mundo e você não deixaria o seu para renascer e quem sabe se tornar um anjo.
Naquele instante Michel não soube o que dizer ou fazer, simplesmente olhou para Ângela com os olhos marejados e o coração partido.