Vaidade
 
Anita mirava-se no espelho, cismava nesse momento, com um vinco que aparecera no canto de seus olhos. Esticava a pele ao redor dos olhos, puxava, massageava, suspendia a pálpebra. Aquilo a incomodava demais! Olhou para o toucador e pegou um dos muitos potes de cremes antirrugas que usava havia anos e pensou: - Essas drogas de nada servem, estou ficando horrorosa e velha! Não conseguia ver que ainda era muito bela e jovem no auge de seus 42 anos. Estava, aliás, para a sua idade, muito melhor até do que algumas mulheres mais jovens do que ela.
 
Entretanto Anita era muito vaidosa. Acostumara-se a ser admirada pelos homens e invejada pelas mulheres. Detestava ter que envelhecer! Só de pensar em ficar velha e enrugada, prefiro a m...! Dissera ela certa vez entre as amigas, quando conversavam sobre o quão horrível é envelhecer.
Anita era  muito bonita, linda mesmo! Quando jovem tivera muitos candidatos a namorados e marido, até que conhecera Alberto, um rapaz que chamava a atenção por seu muito charme, quando ria jogava a cabeça para trás, seu charme era irresistível! Alberto tinha também um lindo sorriso, mas traços belos ele não tinha, mesmo assim as meninas eram loucas por Alberto! Porém Alberto escolhera Anita, pois além de ser muito bela, era inteligente. Conheceram-se na Universidade onde ambos cursavam engenharia e casaram-se dois anos depois de se formarem.
 
Alberto, sempre fora muito apaixonado por Anita. Ela cativara-o para sempre. ele achava que ela tinha sido mesmo um presente. Era louco pela mulher! Por vezes pensava no que seria a sua vida sem Anita e ficava triste só de pensar, não gostava mesmo de imaginar...
 
Era correspondido. Anita amava-o demais, ele era o homem que sempre sonhara para ser seu companheiro. Inteligente, romântico, charmoso, sempre fora e charme num homem era importante para Anita! A beleza nos homens era o de menos, dizia Anita, charme sim, charme não se perde! E Alberto continuava charmoso, talvez até mais, pois com a idade alguns homens ficam ainda mais interessantes e mais charmosos. Também Alberto era um homem decidido, sempre fora muito decidido e Anita gostava muito disso em Alberto.
 
Sua barriga não era mais a mesma, duas gravidez a havia deixado meio flácida, porém Anita corrigira isso em uma mesa cirúrgica. Não podia conviver com aquela barriga horrenda, flacidez não era admissível! Anita pensava, enquanto se olhava no espelho. Acho que preciso de outra lipo, essa barriga está horrível! Mas Alberto não permitiria que ela fizesse isso novamente, da última vez quase morrera na mesa de cirurgia. Houve complicações, uma parada cardíaca e Anita teve que ser ressuscitada pelos médicos. Alberto, na sala de espera fora informado e ficou desesperado, transtornado mesmo com a possibilidade de perder sua mulher. Não, Alberto não permitiria outra violência, era como ele chamava esse tipo de procedimento, achava totalmente desnecessário. - Anita, você é linda e sempre será linda, ainda que tenha uns 90 anos, eu sempre amarei você! Dizia ele. Mas Anita não achava que ele a amaria caso tivesse noventa anos ou até menos, pensava que se tivesse alguns pés de galinhas e um umas celulites, o marido logo trataria de arranjar uma mais “durinha”. Homens! Sei bem como são! Pensava ela.
 
Vinha amadurecendo a ideia há algum tempo. Sempre soube que não suportaria envelhecer. Velha, enrugada, nem morta! - Dizia ela. - Nesse momento Alberto chegou à porta do toalete e disse: Meu amor, você não vem tomar seu café, estou lhe esperando? Anita disse: Querido, já estou indo! Não se preocupe, estou terminando! Porém demorou-se muito ainda e Alberto estava bastante atrasado para poder esperá-la tanto. - Mulheres, quanta vaidade! - Pensava ele.
 
Alberto tomou seu café e foi ao toalete despedir-se da mulher, deu-lhe um beijo e disse: - Meu amor, estarei de volta às sete para irmos ao teatro assistir a tal peça que você tanto quer! - Anita adorava ir ao teatro, era uma paixão, pensou até um dia em ser atriz. Admirava as artes cênicas e tinha grande admiração por Paulo Autran, Fernanda Monte Negro, Bibi Ferreira. Seus grandes ídolos! Haviam combinado de naquela noite assistirem Fernanda em mais uma de suas apresentações...
 
Anita ouviu o barulho da chave na porta. Alberto saíra. Deixou a banheira enchendo, tomaria um banho. Foi até a estante da sala, escolheria um CD. Johnny Mathis, As Time Goes By. Pôs o CD em modo repeat, voltou ao toalete, abriu o gás do aquecedor, porém não o acendeu, apenas abriu o gás e deitou-se na banheira, imersa na água, recostou a cabeça, fechou os olhos enquanto pensava que as rugas e a flacidez jamais a atingiriam... Seria para sempre linda! Nunca ficaria velha! Nunca...
 
 
06.01.11
 
 

 
Ariadne Cavalcante
Enviado por Ariadne Cavalcante em 28/04/2012
Reeditado em 21/03/2017
Código do texto: T3638176
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