Identidade
Tenho medo de tirar
Da frente
Essa procissão
De Cruz Encravada na estrada
Essa imensidão sob o céu
Essa cara fingida.
Sou eu que tenho medo do amor.
Que corre pouco e já se cansa
Sou eu que como quando estou com fome
Bebo quando tenho sede
Amo quando tenho amor
Que chora quando está triste
Que vai embora quase sempre.
Sou eu que amei Raimunda durante 38 anos
Que comi seu feijão com arroz e carne frita
Que dormi em seu pescoço quando estava doente.
Sou eu que sujo as roupas que Raimunda lava
Que tenho esses pé-de-galinhas no rosto desde novo
Essa barriga grande
Que fala bagunçado
Que consegue ser firme quando ama só um pouquinho
Que não sabe ser fino
Que vê a vida no bruto, sem acabamento
encantos
Na terra igual bicho, rastejando, se sujando de realidade
Que amei os campos de feijão
Que lutei na guerra ( da vida)
Fui eu que nasci numa noite
Chuvosa em 1974, as 20: 04, nas mãos do Doutor Wilson. Que veio até em casa.
Que levou um fora traumático
Quando tinha 13 anos. Até hoje escrevo sobre Ieda.
Fui eu que quase morri no Rio da Mula Assada numa tarde
De sol em 1981.
Fui eu que aos 9 anos, sofri um assalto.
Fui eu que mantei um bem-te-vi voando.
Fui eu que apanhei de Bel, um soco no estômago
Que abalou minha estima.
Fui eu que em Janeiro de 1975 despedi da minha mãe
E de meu pai.
Fui eu que me despedi alguns anos depois de novo
Mas dessa vez derradeiro.