O segredo
A nova casa era ampla, iluminada e tinha um quarto só para ela, unicamente para ela! A primeira vez que a viu encantou-se. Exultou quando soube que os pais haviam resolvido comprá-la, depois de tantas buscas que não davam em nada. Logo descobriu que nos fundos, para além de várias árvores frondosas, escondia-se uma peça pequena, independente, com porta e janela aberta para os verdes. Sonhou que aquele recanto seria dela: poderia haver algo melhor para garatujar os seus escritos? Ninguém a perturbaria ali, no fundo do quintal.
Depois de algumas reformas, a família instalou-se na nova casa. E, assim que foi possível, ela esgueirou-se para a peça em questão, colocando a sua máquina de escrever em cima da mesinha que havia debaixo da janela. Não foi difícil arrumar uma cadeira para compor o conjunto. Concentrada em um texto que metodicamente elaborava, perdeu a noção do tempo. Estava à vontade no seu gabinete de trabalho.
Um grito assustou-a: Cristina! E seu nome ecoou mais uma vez no silêncio do anoitecer, em alta voz: Cristina! Deu um pulo, deparou-se com o pai e a mãe na porta, olhos aflitos. Desculpou-se como pode, eles se acalmaram. Queriam saber o que ela fazia ali. Procurou esconder com o corpo as folhas escritas, morta de vergonha. “O que é que tu estavas escrevendo?” A irmã surgiu na porta, curiosa. “Nada, nada de importante.”
A partir daquele dia, não teve mais paz – bastava recolher-se que um dos irmãos vinha sorrateiramente espiar o que fazia. Aprendeu a defender com unhas e dentes a sua produção, como se fosse a coisa mais importante do mundo. E, para ela, não deixava de ser o seu tesouro.