Parte 1 - Saida dos fundos

Quando ele entrou, bateu a porta.

- Merda, Getúlio . Para de fazer barulho!

- Desculpa, Seu Antônio!

- Pode ir pros fundos. Gosto de assistir televisão sozinho...

Morava aqui em casa. Engravidou Geni e meu pai obrigou a morar junto com ela num quartinho dos fundos. Só pra não passar vergonha com o povo da cidade.

- Ninguém vai me perdoar por causa disso.

Com uma irritação, meu pai lamentava e minha mãe dava a solução

- Tem que casar! Faz casar. É o jeito.

Às pressas, chamou Padre Adalto e fez a cerimônia. Foi pouca gente.

Somente aqueles muito próximos que não tinha como não chamar. Todo mundo aqui em casa preocupado com a boca da cidade.

- Quanto menos se falar nisso melhor. Bem que já deve ter estourado pra todo mundo. Imagino aqueles boca suja falando mal de nossa família. – preocupada, minha mãe falava pro meu pai.

- Logo eu. Como vou olhar no olho das pessoas da igreja. Se não faço a lição de casa?

- Agora não tem jeito.

E eu pensava: “bem feito, pra aprender a não ser desse jeito”. Gente besta que vive de aparências. Pegou o rapaz, menino novo, sem trabalho e jogou dentro de casa. Só pra dizer que casou. Numa das visitas que o padre fez a minha mãe, explicou tudo que estava acontecendo. Pedindo, em gesto, clemência pelo pecado cometido. A casa impecável pra receber o homem. Todo mundo tomado banho e todo tipo de comida. Tratado igual rei, comendo do bom e do melhor enquanto ela lhe explicava a tragédia. Como se quisesse conquistar algum perdão. E antes de sair, deixou claro que seria melhor minha mãe se afastar um pouco da missa. “Só até a poeira baixar”

O rapaz era de uma sem-gracice. Não conversava quase nada. E quando falava, ninguém dava atenção, porque não dizia nada com nada. De tão moço que era. Quando saia de casa, era visto perto de sua casa soltando pipa ou jogando pião.

- É gentinha da rua do rio, comadre. A mãe vive num pobreza de dar dó. Pescando piaba de tarde pra comer de noite. Não tem estudo nenhum.

- Nunca estudou?

- Pouca coisa. Deve assinar o nome. Que futuro ele vai dar?

- Nem sei que responder pra senhora.

- Vai ser só mais uma boca aqui em casa.

Procurava uma pausa no chão e continuava:

- Conheci esse menino tomando banho no rio. Já vi até pedindo comida na feira quando era mais novo. Um pobre diabo. E agora dentro de minha casa se dizendo marido.

- Mas a culpa é sua. Comade Cida, de não aguentar a vergonha.

- É o preço que se paga pela decência, comadre!

- E Jeni, gosta disso?

- É muito nova, comadre, não sabe ainda escolher as coisas...

- Será , comadre?

- Sim, tenho certeza. A gente que é mais esclarecido precisa cuidar desses assuntos. E não está sendo fácil não.

- Não deveria ouvir um pouco ela?

- Comadre, que juízo tem essa menina?

Ariano Monteiro
Enviado por Ariano Monteiro em 10/04/2012
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