Silhueta delgada

Clara foi uma adolescente rechonchuda, e chegou gordinha à idade adulta.

Ela imaginava que as mulheres magras se sentiam poderosas, e estava disposta a aceitar sacrifícios para manter uma silhueta delgada, tendo como maior desejo usar uma calça jeans com o menor número que conseguisse encontrar nas lojas.

Enfastiada com a rotina de ir e vir ao supermercado, padaria, varejão, sorveteria, loja de conveniência, mercadinho, incluindo também a farmácia, onde obtinha laxantes, desfazedor de gases e gorduras, além das fórmulas para emagrecer que não necessitavam de receita médica.

Clara já não agüentava mais buscar esse ideal impossível, mas só decidiu mudar depois de sonhar que estava sendo torturada num castelo na idade média.

O instrumento de tortura consistia numa armação feita de arame, varas de madeira e barbatanas de baleia revestidas de tecido. Na frente e atrás havia cordões e colchetes. A estrutura foi colocada em volta do seu tronco como uma armadura, e os cordões apertados até o limite.

Sua cintura ficou espremida com a barriga pressionada para dentro. Os seios estufaram para cima e os quadris foram empurrados para trás, deixando Clara magérrima, com cinturinha fina e seios, quadris e coxas fartos. Agora ela era havia se tornado uma mulher desejável. Havia atingido o padrão de beleza da época: ter o corpo em forma de violão.

Mas, a dificuldade para respirar e a restrição dos movimentos, levou Clara ao desespero.

Ela tentou fugir do castelo, mas presa naquela armadura era impossível.

Clara acordou assustada de manhã, tirou o espartilho de dentro da cabeça e tomou uma atitude.

Rejeitando o papel de mulher objeto, sentindo-se louca, mas com lucidez suficiente para saber que precisava de ajuda, foi procurar um analista.

Descobriu a felicidade quando se assumiu como uma mulher gostosa e que nunca será esquelética porque sua estrutura não é assim.

Clara se deu conta de que a ditadura da magreza é uma questão cultural, coisa de época, mas que depende da submissão total da mulher para sustentá-la.

Leila Seleguini

Abril de 2012

Leila Seleguini
Enviado por Leila Seleguini em 09/04/2012
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