Abolinanados

- Durvalina é tão bonita né, mãe?

- Tá apaixonado é? – meu pai enchendo meu saco.

Ele é assim, não posso falar de alguém que ele já vem me sacaneando...Vive dizendo que ninguém quer namorar comigo.

- Você acha?

- Acha o quê

- Que ela é bonita...

- É...

- Uma menina dessas é pra gente rica. E você é pobre.

-

Como era porco meu pai. Um panaca. Só não falava pra ele. Só sabia me deixar pra baixo. Nunca falava nada pra fazer a gente feliz...

- Cadê seu pai?

- Num sei.

- Na mesa de jogo, que é só lá que ele anda...

- Num sei, nem quero saber..

- Vai lá chamar ele. Diz que o almoço está pronto...

Já saindo da porta.

- Jonas!

- Que foi?

- Próxima vez que falar assim comigo de novo arranco seus dentes. Seu mal-criado!

Dava uma raiva isso. Não suportava ir no bar chamar. Não me sentia bem naquele lugar. Minha vó falava tanto mal desses lugares, que eu passei a olhar a mesa de sinuca com os olhos dela. Com nojo.

- Pai.

Olhou pra mim feio. Como se eu tivesse atrapalhado seu tacada. Sobre a tabela, dez cruzeiro de cada lado. Era aposta...

- O quê

- Mainha tá chamando...

- Já vou.

- Acho melhor o senhor ir logo. Ela está com raiva...

- Eu tô lá ligando pra raiva de sua mãe!

- Ta bom, aviso pra ela...

- Espera... Vou terminar essa e já vou....

- Quer que espere.?

- Se quiser.

Só sabia falar assim, com grossura, mostrando para os amigos que era ele que mandava.

Ele era revoltado, mas cagava de medo dela. Assim como eu. Alias não conheço ninguém que não tem medo de mainha. Quando está com raiva voa pra cima dele com palavrão. Eu fico envergonhado de ver meu pai se defendendo daquele jeito. Mesmo assim, continua safado, gastando o que não tem no jogo e correndo atrás de raparigas na Rua do Leite.

- Espero que quando você crescer não fique como seu pai.

- To fazendo nada aqui?

- Só tô abrindo seu olho!

- Nem saio pra lugar nenhum...

- Falo assim sabe porquê? Já basta de vagabundo na minha vida...

Oh, merda de vida. Tudo peste. A única que dar pra ter pouco de conversa é com minha vó. Quase todo dia passava em sua casa. Só não gosto quando me leva pra casa de Dona Emília pra tirar quebranto. Vive dizendo que estou pálido e que alguém me colocou olhado..

- Esse menino é muito bonito – dizia pra minha vó.

- O que que tem isso, Dona Emilia? – eu perguntava

- É que o olho das pessoas crescem com gente lustrosa.

- Então reza logo, comadre! – Falava minha vó com a cara assustada

- Vou pegar as folhas de romão. Senta naquele cadeira, meu fi.

E velha saia e voltava mascando fumo. Um fedor saia da boca dela junta com as palavras assopradas que não entendia direito. E vez ou outra dava um cusparada no chão. Meu estômago espumava de nojo. Ela só tinha um dente do lado, manchado de amarelo e preto. Quando ela ria era como um vampiro aleijado. Os beiços mexia enquanto eu levava uma surra de mato. . A velha sentava na mesa toda satisfeita e comia todo o biscoito e a geléia. Gargalhava alto, jogando cuspe do ar. Deixava mesa toda comprometida. E ainda cobrava um dinheiro bom. Acho que olho grande era dela. Na volta, minha vó contava umas história do tempo de quando era moça. E pegando no meu cabelo:

- Já está mais coradinho. Quem não tem fé em Nossa senhora aparecida heim, Nego?

- Tô? Já fez efeito?

- Agradece, faz um nome do pai, faz.

- Agora?

- É... agora. Anda!

Nessa parte eu não gostava. Quando me obrigava a agradar demais algum santo. Fiquei feliz quando ela disse que já estava coradinho. Pensei em Durvalina me achando assim, mais moreno. Já deve ter chegado da escola. Todo dia eu fico na janela só pra ver ela passar. Bonita, viu. Nem parece que só tem 13 anos, já tem tudo que uma mulher de verdade. Só rosto que quando se esquece parece de menina. Mora na casa mais bonita da cidade, mais bonita ainda que a de Salvador Santana, que é o prefeito e muito rico. O pai dela é dono de gado, muitos bois em várias fazendas. Mas cresce bem simples, perto da gente, como se fosse do povo da rua. Se eu namorar com ela, vai ser escondido, de tão bonita que é. acho que ficaria com vergonha de andar de mãos dadas. E meu pai ia morrer de inveja,

Ariano Monteiro
Enviado por Ariano Monteiro em 09/04/2012
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