O Jovem Andarilho
Sua vida era como uma canção da (Legião Urbana), porém sem melodia. Seu espírito era inconstante, oscilava entre a brandura e a hostilidade. Era impossível a si mesmo saber em que estado o seu âmago se encontrava ─ era um sujeito complicado e seu humor variava entre a extravagância e o retraimento─. Era como a maré, mas não tinha hora nem lua e vacilava entre o cheio e o vazio.
Ele era um silvícola. Nunca havia se deixado domar, sentia que a sociedade o oprimia, sufocava-o. Nas entranhas de sua mente confusa pensava que todos o consideravam um louco e que apenas eles eram lúcidos, ─ detentores de uma razão que pensavam ser de origem incontestável.
Ele se sentia vazio... Tão vazio quanto pensava faltar partes em si. Olhava este mundo com o mesmo olhar de Prometeu*, via todo o sofrimento presente nele, e consequentemente sofria o mesmo castigo daquele que um dia roubou o fogo.
Seguia pagando por dívidas alheias à sua própria consciência. Conter a cólera era uma função que vinha desempenhando arduamente. Por vezes quis ser bruto, já estava farto de responder aos cumprimentos diários com positividade. Sentia-se um hipócrita, ele queria falar a verdade, mas sempre se continha por alguma razão.
Não era uma pessoa ruim, apenas teve que aprender a duras penas que a vida não é singela. Por fora ostentava com opulência uma figura de durão, mas por dentro seu coração era frágil. Seu ar rude foi-se moldando aos poucos, pois caso não se escondesse em sua carapaça impenetrável talvez o ferissem novamente. Tinha em si uma certeza de que se fosse procurar no mundo aquilo que mais odiava acabaria encontrando-se. Não era sua culpa, todas as vezes que tentou aproximar-se de alguém saiu ferido e, passou a considerar o ódio a si mesmo como a única forma de evitar amar a outrem. Pouco lhe valia a sua mente sã, todos os seus membros completos, se sua alma era incompleta. Queria tanto seguir um caminho diferente, mas antes precisava sair do labirinto onde se encontrava.
Um dia ele partiu levando nas costas uma mochila e em sua mente muitos sonhos. Foi-se quando a relva era verde, as flores exalavam o seu perfume, e a chuva caía-lhe fraca sobre a face. Em seus olhos ardia a chama da juventude. Seu coração era forte, ─ batia tão acelerado quanto o motor do Diplomata* que sempre sonhou. Em suas veias o sangue corria tão fortemente que se igualava às correntezas do rio bravio que cortava o pequeno vale onde morava. Seu espírito era inquieto e o instigou a fugir e como uma pipa após ter sua linha cortada esvoaça sem rumo ao vento, neste dia decidiu partir.
Foi-se inconsequentemente, como náufrago que em meio ao desespero lança-se ao mar em frágil balsa sem velas nem remos e ao sabor do vento ele ganhou as estradas a esmo. Para trás ficaram os poucos amigos e os familiares, que logo o tempo encarregou-se de ofuscar as feições de sua mente.
Foi-se pela manhã há muito tempo e agora voltar não dava mais, e ao findar de mais uma noite em meio ao mundo, após uma fria noite de inverno ao relento, o orvalho ainda se encontra sobre as folhas e os primeiros raios de sol surgem no horizonte, da mesma maneira como surgiam todos os dias no seio de sua terra natal. Olhar para trás o faz querer voltar, mas é convicto em sua decisão de seguir em sua busca e esta decisão esmaga-lhe o coração. Sente como se o mundo tivesse se tornado em uma prensa e o esmagasse.
A felicidade nunca lhe foi pertencente, a dor que há tanto tempo aninhou-se em seu ser ainda não o tinha deixado. Quando perdeu o gosto pelo viver não sabe, pois tudo lhe foi sendo tirado aos poucos, como rocha que se dissolve ao vento. Ele queria tanto que seus entes queridos soubessem que nem sempre foi triste, nem sempre foi desiludido, queria que soubessem que um dia este já teve sonhos, já foi feliz e sorriu com a mesma pureza de espírito presente apenas nas crianças. Mas há quanto tempo foi isso?
A vida errônea pelo mundo levou-lhe a experimentar coisas que sua doce mãe sempre reprovou. No intento de aplacar a dor e preencher o seu vazio entregou-se ao alcoolismo, mesmo sabendo que as drogas são como ondas que quebram na praia, levando embora alguns problemas, mas trazendo outros, ele experimentou. No fundo ele era como um animal selvagem que nunca poderia ser domado, mesmo que o aprisionassem os seus instintos nunca se extinguiriam.
O jovem andarilho era apenas alguém que trazia na face as marcas das escolhas e na mente a certeza de que embora adversa, sua vida foi vivida plenamente. Às vezes sentia como se o solo estivesse desaparecendo sob os seus pés, parava a olhar por alguns instantes as pessoas ao seu redor, analisava cada gesto, cada face e o modo como cada indivíduo se expressava. Levantava questões, formulava perguntas às quais estava distante de obter respostas e quando obtinha algum êxito em suas indagações não passavam de respostas vagas de sentido, que traziam consigo mais e mais questionamentos. Ele sabia que um dia isso o levaria à loucura, mas insistia em tentar compreender as pessoas. No fundo ele sabia que não estava errado, o mundo é que estava pelo avesso, o mundo é que estava na contramão.
Ele fez suas próprias escolhas... Escolhas que apenas homens excepcionais poderiam fazer. Ele escolheu emancipar-se, livrar-se de tudo que o mantinha preso neste círculo contraditório. Se ninguém o compreendia, se não existia alguém que pudesse completá-lo, que o deixassem em paz e não lhe tomassem o pouco que lhe restava.
Diante de sua vasta visão, enxergava como este mundo estava podre. E a cada dia via o ser humano como as larvas que se proliferavam nas chagas do mundo. Era um amante da solidão, pois só ela lhe permitia ouvir seus próprios pensamentos e imergir na contemplação das mazelas do mundo. Negando a si mesmo passou a rejeitar o amor e a companhia das pessoas, ele era um nômade solitário, a estrada que seguia não tinha volta e nela cabia apenas uma pessoa. Acostumou-se a contemplar o céu sozinho e sabia que seria para sempre assim.
Várias vezes lembranças de um passado longínquo perturbavam-lhe a mente, as mesmas cenas, as mesmas palavras de pessoas que lhe viravam as costas e diziam adeus. Se ao menos estas pessoas o tivessem dado uma chance... Ele tinha tantas coisas para falar, porém não conseguiu, não deixaram que o tempo agisse a seu modo e o que ele tinha para dizer se perdeu num universo inalcançável. E por muito tempo ele permaneceu aprisionado entre meios termos, preso num tempo que se foi, e que persistia em se fazer presente.
Ele tinha muitos planos, entretanto, apenas o tempo poderia concretizá-los. Converteu suas aspirações em desejos coletivos sem dar-se conta que as pessoas eram tão egoístas que não estavam dispostas a compartilhar com ele os seus sonhos. A vida o presenteou com o dom de crer nas possibilidades, em sua mente juvenil fazia de desertos lindos jardins verdejantes e de meras rochas brutas jóias de beleza rara. O anseio por novas sensações davam-lhe o poder de alcançar o firmamento sem sequer deixar o chão, sua ingenuidade em acreditar na bondade humana o levou a compartilhar o que lhe foi concedido. Mas com o tempo as pessoas foram roubando-lhe a capacidade se sonhar, e como um anjo caído em meio aos ímpios, as pessoas arrancaram suas penas uma por uma, para que jamais pudesse sonhar com as nuvens novamente.
E assim depois de tantos pesares ele passou a refutar a felicidade que batia à sua porta por temer que a tristeza e a solidão que as sucederia fosse ainda maior do que todas as amarguras pelo qual já havia passado.
Sua vida era como uma canção da (Legião Urbana), porém sem melodia. Seu espírito era inconstante, oscilava entre a brandura e a hostilidade. Era impossível a si mesmo saber em que estado o seu âmago se encontrava ─ era um sujeito complicado e seu humor variava entre a extravagância e o retraimento─. Era como a maré, mas não tinha hora nem lua e vacilava entre o cheio e o vazio.
Ele era um silvícola. Nunca havia se deixado domar, sentia que a sociedade o oprimia, sufocava-o. Nas entranhas de sua mente confusa pensava que todos o consideravam um louco e que apenas eles eram lúcidos, ─ detentores de uma razão que pensavam ser de origem incontestável.
Ele se sentia vazio... Tão vazio quanto pensava faltar partes em si. Olhava este mundo com o mesmo olhar de Prometeu*, via todo o sofrimento presente nele, e consequentemente sofria o mesmo castigo daquele que um dia roubou o fogo.
Seguia pagando por dívidas alheias à sua própria consciência. Conter a cólera era uma função que vinha desempenhando arduamente. Por vezes quis ser bruto, já estava farto de responder aos cumprimentos diários com positividade. Sentia-se um hipócrita, ele queria falar a verdade, mas sempre se continha por alguma razão.
Não era uma pessoa ruim, apenas teve que aprender a duras penas que a vida não é singela. Por fora ostentava com opulência uma figura de durão, mas por dentro seu coração era frágil. Seu ar rude foi-se moldando aos poucos, pois caso não se escondesse em sua carapaça impenetrável talvez o ferissem novamente. Tinha em si uma certeza de que se fosse procurar no mundo aquilo que mais odiava acabaria encontrando-se. Não era sua culpa, todas as vezes que tentou aproximar-se de alguém saiu ferido e, passou a considerar o ódio a si mesmo como a única forma de evitar amar a outrem. Pouco lhe valia a sua mente sã, todos os seus membros completos, se sua alma era incompleta. Queria tanto seguir um caminho diferente, mas antes precisava sair do labirinto onde se encontrava.
Um dia ele partiu levando nas costas uma mochila e em sua mente muitos sonhos. Foi-se quando a relva era verde, as flores exalavam o seu perfume, e a chuva caía-lhe fraca sobre a face. Em seus olhos ardia a chama da juventude. Seu coração era forte, ─ batia tão acelerado quanto o motor do Diplomata* que sempre sonhou. Em suas veias o sangue corria tão fortemente que se igualava às correntezas do rio bravio que cortava o pequeno vale onde morava. Seu espírito era inquieto e o instigou a fugir e como uma pipa após ter sua linha cortada esvoaça sem rumo ao vento, neste dia decidiu partir.
Foi-se inconsequentemente, como náufrago que em meio ao desespero lança-se ao mar em frágil balsa sem velas nem remos e ao sabor do vento ele ganhou as estradas a esmo. Para trás ficaram os poucos amigos e os familiares, que logo o tempo encarregou-se de ofuscar as feições de sua mente.
Foi-se pela manhã há muito tempo e agora voltar não dava mais, e ao findar de mais uma noite em meio ao mundo, após uma fria noite de inverno ao relento, o orvalho ainda se encontra sobre as folhas e os primeiros raios de sol surgem no horizonte, da mesma maneira como surgiam todos os dias no seio de sua terra natal. Olhar para trás o faz querer voltar, mas é convicto em sua decisão de seguir em sua busca e esta decisão esmaga-lhe o coração. Sente como se o mundo tivesse se tornado em uma prensa e o esmagasse.
A felicidade nunca lhe foi pertencente, a dor que há tanto tempo aninhou-se em seu ser ainda não o tinha deixado. Quando perdeu o gosto pelo viver não sabe, pois tudo lhe foi sendo tirado aos poucos, como rocha que se dissolve ao vento. Ele queria tanto que seus entes queridos soubessem que nem sempre foi triste, nem sempre foi desiludido, queria que soubessem que um dia este já teve sonhos, já foi feliz e sorriu com a mesma pureza de espírito presente apenas nas crianças. Mas há quanto tempo foi isso?
A vida errônea pelo mundo levou-lhe a experimentar coisas que sua doce mãe sempre reprovou. No intento de aplacar a dor e preencher o seu vazio entregou-se ao alcoolismo, mesmo sabendo que as drogas são como ondas que quebram na praia, levando embora alguns problemas, mas trazendo outros, ele experimentou. No fundo ele era como um animal selvagem que nunca poderia ser domado, mesmo que o aprisionassem os seus instintos nunca se extinguiriam.
O jovem andarilho era apenas alguém que trazia na face as marcas das escolhas e na mente a certeza de que embora adversa, sua vida foi vivida plenamente. Às vezes sentia como se o solo estivesse desaparecendo sob os seus pés, parava a olhar por alguns instantes as pessoas ao seu redor, analisava cada gesto, cada face e o modo como cada indivíduo se expressava. Levantava questões, formulava perguntas às quais estava distante de obter respostas e quando obtinha algum êxito em suas indagações não passavam de respostas vagas de sentido, que traziam consigo mais e mais questionamentos. Ele sabia que um dia isso o levaria à loucura, mas insistia em tentar compreender as pessoas. No fundo ele sabia que não estava errado, o mundo é que estava pelo avesso, o mundo é que estava na contramão.
Ele fez suas próprias escolhas... Escolhas que apenas homens excepcionais poderiam fazer. Ele escolheu emancipar-se, livrar-se de tudo que o mantinha preso neste círculo contraditório. Se ninguém o compreendia, se não existia alguém que pudesse completá-lo, que o deixassem em paz e não lhe tomassem o pouco que lhe restava.
Diante de sua vasta visão, enxergava como este mundo estava podre. E a cada dia via o ser humano como as larvas que se proliferavam nas chagas do mundo. Era um amante da solidão, pois só ela lhe permitia ouvir seus próprios pensamentos e imergir na contemplação das mazelas do mundo. Negando a si mesmo passou a rejeitar o amor e a companhia das pessoas, ele era um nômade solitário, a estrada que seguia não tinha volta e nela cabia apenas uma pessoa. Acostumou-se a contemplar o céu sozinho e sabia que seria para sempre assim.
Várias vezes lembranças de um passado longínquo perturbavam-lhe a mente, as mesmas cenas, as mesmas palavras de pessoas que lhe viravam as costas e diziam adeus. Se ao menos estas pessoas o tivessem dado uma chance... Ele tinha tantas coisas para falar, porém não conseguiu, não deixaram que o tempo agisse a seu modo e o que ele tinha para dizer se perdeu num universo inalcançável. E por muito tempo ele permaneceu aprisionado entre meios termos, preso num tempo que se foi, e que persistia em se fazer presente.
Ele tinha muitos planos, entretanto, apenas o tempo poderia concretizá-los. Converteu suas aspirações em desejos coletivos sem dar-se conta que as pessoas eram tão egoístas que não estavam dispostas a compartilhar com ele os seus sonhos. A vida o presenteou com o dom de crer nas possibilidades, em sua mente juvenil fazia de desertos lindos jardins verdejantes e de meras rochas brutas jóias de beleza rara. O anseio por novas sensações davam-lhe o poder de alcançar o firmamento sem sequer deixar o chão, sua ingenuidade em acreditar na bondade humana o levou a compartilhar o que lhe foi concedido. Mas com o tempo as pessoas foram roubando-lhe a capacidade se sonhar, e como um anjo caído em meio aos ímpios, as pessoas arrancaram suas penas uma por uma, para que jamais pudesse sonhar com as nuvens novamente.
E assim depois de tantos pesares ele passou a refutar a felicidade que batia à sua porta por temer que a tristeza e a solidão que as sucederia fosse ainda maior do que todas as amarguras pelo qual já havia passado.