A liberdade tem asas!

Alice tinha um passarinho, um canário meio sem graça que caiu em seu jardim. Alice cuidou do canário desde o dia em que o viu, todo pequenino, sem saber voar ou emitir algum ruído que pudesse resultar em algum pedido de ajuda. Cuidou dando-lhe o que comer e cuidando de seus machucados e sempre alertou o pequeno para não voar muito longe, principalmente para não adentrar na casa da vizinha. “Pequenino, pequenino, não vás tão longe e retorne a casa antes do entardecer. Lembra-te também de ficar longe da casa da vizinha, sabes que ela tem uma gata que pode ferir-te”. O canarinho sempre prestava atenção aos cuidados de Alice e seguia seu voo diário, retornando sempre às 17h.

Um certo dia o pequenino, voando arredores, percebeu que a casa da vizinha apresentava árvores com frutos e flores que ele não conhecia, quais despertaram sua curiosidade. Eram muito mais formosos e saborosos que os de sua casa. Enquanto as frutas, frutos e flores de Alice apresentavam-se um pouco sem vida e sem graça, os da vizinha eram bonitos e atraentes. A vizinha também tinha um lindo jardim e uma casa extremamente confortável, ao contrário de Alice que não oferecia muito além do que um jardim e uma janela aberta. Lembrando dos conselhos de sua amiga, pensou “ela não manda em mim, não tem o direito de dizer como e o quê devo fazer!” Tendo isso, resolveu adentrar e cantarolar, a fim de dizer à vizinha o quão mais interessante estava tudo aquilo ao seu redor, dizendo que trocaria o jardim sem graça de sua atual dona pelo colorido e belo jardim que estava diante de seus olhos. Ah, mas não foi necessário muito a ela para que pudesse se apaixonar, o canto era lindo e o canarinho tão simpático! “Mas olha só, você quer ficar aqui? Seja muito bem vindo, meu pequeno! Isto tudo agora será seu!” O canarinho não hesitou em trocar aquilo que tinha pela novidade, nem questionou se Alice ficaria chateada, pensou que talvez pudesse conciliar as duas casas, as duas vidas “Alice nem sentirá falta, nem ficará sabendo!” Porém, Alice percebeu sua ausência e o viu todo feliz na casa ao lado.

Não foi necessário muito tempo para que o canarinho percebesse que suas regalias eram poucas e que tudo não era tão belo quanto parecia. Ele não podia comer das frutas que estavam no jardim, nem brincar com as flores, pois sua dona não permitia que ele as estragasse e interferisse na beleza de seu jardim. Não demorou muito também para que a gata da vizinha começasse a salivar por ele. Todo gato é esperto, porém esta em questão, além de preguiçosa, era um tanto quanto “devagar”, pra não dizer burrinha mesmo. Era uma gata gorda, mal humorada, que vivia se arrastando pelos cantos e com um miado que variava entre reclamações a agrados interesseiros. O canarinho viu que precisava manter-se distante da felina, lembrou dos conselhos de Alice, mas ainda assim não quis retornar a sua antiga casa

Um dia o canarinho estava distraído, cantarolando e olhando aquele lindo jardim, intocável e emoldurado por sua janela, quando sentiu algo se aproximando... PLAFT! Era a gata! O canarinho saiu em disparada, foi pio, penas, patas e pêlos para todos os cantos! Até que a barulheira chamou a atenção de sua dona, que veio lhe socorrer. “Ah, pequenino, tu queres morrer? Onde tu estavas com a cabeça? Queres virar comida de bichano, é??? Pois não te preocupes, meu pequeno, eu tenho algo que te trará segurança, não terás que fugir mais da gata e, ao mesmo tempo, terás a sua companhia. Olha o que trouxe, estás vendo? É uma casinha para ti!” O canarinho agora estava preso em uma gaiola. Ah, canarinho, se tu soubesses, se tu tivesses ouvido o conselho de Alice! “Ah, Alice, perdoa este passarinho que traiu sua confiança, que te trocou por encantar-se tão facilmente por cores, ó minha Alice, se tu pudesses ouvir meu canto, meu pranto, ah, Alice... se pudesse estar ao seu lado...” O canarinho permaneceu alguns dias chorando e cantando baixinho, como se clamasse por liberdade. Não comia, nem sequer observava o seu lindo jardim. Até que um dia Alice, passeando pelas ruas, viu seu canarinho preso a uma gaiola em uma casa próxima a sua. “Oh, mas o que fizeram contigo, meu pequenino fujão?” e assobiou, esperando uma resposta. O canarinho, fraco, mal conseguia manifestar-se e soltou um assobio baixo, triste, sem força e quase inaudível. Alice, não se conformou com aquele ruído e resolveu cantar uma música que ensinou a seu canarinho, se prosseguisse com o canto significaria que queria retornar a antiga casa, se ignorasse preferiria permanecer na atual. O canarinho pôde observar Alice do outro lado e esforçou-se para que sua verdadeira amiga pudesse vê-lo e tirá-lo dali, para que assim ele pudesse voltar ao seu lar. “mas eu sabia, meu canarinho, eu sabia!! Calma, pequenino, irei resgatar-te, fiques calmo para que não chamemos a atenção da vizinha e de sua gata nojenta” Alice pulou o portão, invadiu o jardim sem se importar com as flores que pisoteava pelo caminho, pulou a janela e abriu a gaiola em que o canarinho estava. O pequenino estava tão fraco que mal conseguia voar. A menina o pegou no colo, saiu disfarçadamente pela janela, pulou novamente o portão e caiu do outro lado, ralando o joelho e braços. “Agora canarinho teremos que ser breves, a vizinha está a caminho e não pode nos ver por aqui, vamos canarinho, vamos! Esconda-te em meu bolso, enquanto eu finjo ter tropeçado, a vizinha está chegando da padaria e com tantas sacolas não te perceberás aqui comigo”. “Menina, o que é que te aconteceu?” “Ora, dona, foi apenas um acidente. Estas calçadas tão esburacadas...! Minha mãe sempre me alertou para não correr pelas ruas, mas tu sabes, crianças são desobedientes e não costumam dar atenção ao que os outros dizem. Precisei ver com meus olhos, braços e joelho que devo ser mais cuidadosa.” “Menina, cuida-te, tenha bons modos e não corra, não quero ninguém caído em frente de minha casa”. “Sim, senhora, pode deixar. Uma boa tarde!”

O canarinho pôde voltar a sua casa, voltar a seu lar, viver em liberdade e junto de sua amiga. Ele aprendeu que estar em casa é estar rodeado de amor, de liberdade e que muitas vezes certos conselhos, que mais parecem imposições, são, no fundo demonstrações de carinho e cuidado.

Já enquanto isso, na casa da vizinha...

“Ah, mas sua gata danada, o que são estas penas pelo chão? Tu comeste outro de meus passarinhos? Tu não te contentas com a comida que tens, não? Olha a sujeira que fizeste! Já para o quintal, gata mal criada!”

Gabi Poles
Enviado por Gabi Poles em 20/03/2012
Reeditado em 20/03/2012
Código do texto: T3564555