UMA SOLIDÃO QUE PARECE NÃO TER FIM

LIVRO: NO ESCURO, EU SONHAVA...

Capítulo 11:

Uma solidão que parece

não ter fim...

O quarto era muito mal iluminado, a única brecha de luz que penetrava nele, vinha de um pequeno e antigo basculante que dava direto para o poço, aquele mesmo poço que outrora quase receberia Jorge como um morador eterno, tudo no quarto era muito antigo e muito velho.

O novo quarto era quase do mesmo tamanho que o seu quarto antigo, pelo menos de espaço Rebeca não poderia se queixar, pena que era só essa a única vantagem.

De um modo estranho as paredes eram úmidas e o chão escorregadio, com alguns buracos em pontos estratégicos. Existia um colchão muito duro encostado em um dos cantos da parede, Rebeca já havia sentado nele diversas vezes para testá-lo, ele não era tão ruim, embora exalasse um cheiro de mofo insuportável, que não dava para aguentar, mas com o tempo Rebeca foi se acostumando ao cheiro.

No quarto também havia uma cadeira de balanço antigo, que já não balançava mais, tinha um cobertor cheio de carrapatos e uma estante cheia de livros do tempo em que sua mãe dava aula, além dos livros de professor, também tinha livros de leitura, alguns romances, Shakespeare, contos policiais, Édipo e muitos outros.

Rebeca já sabia alguma coisa sobre literatura, mas nunca foi tão apegada a ler livros, poderia ser por influência de seu pai ou por mera preguiça, ela não sabia, mas agora a única companhia que ela teria ali dentro, seria aqueles livros fétidos e quase podres pela umidade.

Rebeca nunca tinha entrado antes naquele cômodo, nem sequer tinha notado sua presença, nesses oito anos que ela morava naquela fazenda. Mas agora ela sabia muito bem onde ele ficava por fora, pois se o basculante dava uma ampla visão do poço, o quarto só poderia estar localizado no subsolo da fazenda em direção ao lado leste da casa, portanto ficava exatamente em cima do quarto de seu pai, mesmo se ela gritasse ninguém a ouviria, até porque ela não tinha nem um outro parente próximo, a não ser Hugo, que era mancomunado com seu pai, provavelmente compactuavam com a loucura.

A única esperança de Rebeca era sua irmã, Penélope, mas infelizmente era tão manipulada por seu pai, que nunca iria ajudá-la a sair daquele tormento.

- Pai, onde está a Rebeca, eu já olhei no quarto dela, mas ela não estava lá, estou ficando preocupada, será que ela tentou fugir novamente? – perguntou Penélope, ansiosa pela resposta.

- Não sei querida... – respondeu Horácio.

- Como assim, não sabe, ela estava conversando com o senhor há pouco tempo atrás, lembra?

- Sim...simm... Mas acontece que agora ela está de castigo, num lugar muito secreto, onde ela não poderá fugir, nunca mais, nem poderá influenciar você, com idéias errôneas. – disse Horácio, tentando conter sua fúria enquanto falava de Rebeca.

- Mas papai, nem eu posso saber que lugar é esse, que ela ficou de castigo?

- Não, essa é minha resposta definitiva, não quero ouvir choro, nem resmungos, nervoso como eu estou hoje, não sei o que seria capaz de fazer! – rosnou Horácio, deixando Penélope trêmula de pavor e de angústia.

- Mas...pa..pa...i...

- Já disse que não quero...

- Está bem.

- Assim é melhor.

- E como vamos cuidar dessa situação, no mínimo periclitante, meu bom irmão? – indagou Hugo, que havia acabado de chegar para buscar sua charrete, que Horácio tinha esquecido de entregar em sua fazenda de manhã.

- Ah! Não sei, não sei realmente o que eu vou fazer sobre Ruth e o outro lá... – disse Horácio, fazendo sinal para que Hugo sentasse em um dos sofás da sua sala de estar.

- Jorge.

- Esse mesmo.

- É essencial que tomemos providência, para que eles nunca mais voltem a incomodar sua família e também sua própria segurança.

- Eu sei disso, pensei sobre esse assunto a noite inteira... Mas não consigo enxergar uma saída para tudo isso...

- Pois não se preocupe, já cuidei de tudo, sabia muito bem que você não conseguiria encontrar uma solução, então já encaminhei um processo em seu nome para meus advogados, eles estão cuidando do caso para você.

- Oh!!! Você é mesmo muito esperto, mas e se eles forem inocentados... Vão querer levar Penélope com eles.

- E Rebeca.

- Que seja.

- Não precisa se preocupar com isso também, o delegado me informou que ambos ficaram detidos até a sentença do julgamento, agora, só resta acharmos provas para incriminá-los por tentativa de homicídio e sequestro, eu te garanto, que eles ficaram um bom tempo presos.

Rebeca estava pensativa em seu cativeiro, pelos cálculos dela e pela luminosidade do ambiente já deveriam ter passado umas cinco horas, desde que Horácio a prendeu ali.

A cada hora que passava Rebeca ficava mais ansiosa e com mais fome, seu estômago estava roncando muito, ela não estava acreditando que seu pai a mataria da pior forma possível, a fome e a sede.

Ela tentou se deitar, mas de nada adiantava, quanto mais ela pensava na fome, mais ela sentia. Sua boca já estava toda ressecada. O pior era que nem o sono vinha sobre ela, para que ela pudesse esquecer um pouco do rumo que sua vida estava tomando.

Além de seu rosto estar tremendamente debilitado pelo tombo da charrete, ela ainda tinha que morrer desidratada, pensava Rebeca.

O seu nariz ainda estava doendo muito, mas por pura sorte, não havia quebrado, mesmo assim, Rebeca sentia que seu nariz, agora, obteve uma leve inclinação para o lado esquerdo do rosto, apenas com o tato, já que não havia espelhos no quarto. Seus olhos ainda estavam bastante inchados e roxos, com a ponta do cobertor cheio de pulgas e outros insetos minúsculos, Rebeca conseguiu aplacar o sangue que estava saindo de seus lábios constantemente.

Enquanto isso no segundo andar da casa, Penélope se queixava de uma forte dor de cabeça, dor no corpo, dor de garganta, frio e falta de apetite.

- Bem feito para você, quem mandou a senhorita tentar fugir com a sua mãe, para bem longe do papai... – reclamou Horácio.

- Mas... Pa...pai. – gaguejou Penélope.

- Mas papai, coisa nenhuma, agora você está muito doente, provavelmente um resfriado dos fortes, torça para que isso não vire uma pneumonia, pois senão terei que interná-la. Você quer ficar para o hospital?

- Não papai...

- Então reaja, se alimente bem, pode deixar que eu vou comprar alguns remédios para você na cidade, e ainda trarei um presente que você irá gostar muito!

- Um presente?

- Sim...

- Obrigada papai, mas será que eu poderia ver Rebeca?

- Acho que já conversamos sobre esse assunto... – disse Horácio, apertando com força o lençol da cama de Penélope.

- Também trarei um presente para Rebeca, pois creio que se eu não trazer para ela e trazer só para Penélope, ela morrerá de tanto ciúmes, coitadinha, deve estar tão tristonha e sozinha naquele quarto maravilhoso que preparei com todo meu carinho para ela. – disse Horácio consigo mesmo.

Gabriel de Paiva Fonseca
Enviado por Gabriel de Paiva Fonseca em 22/02/2012
Código do texto: T3513015
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