Anos dourados

Os anos dourados

Ele olhava pela janela de seu apartamento na Avenida Paulista.

Era no décimo segundo andar, mas ouvia claramente o barulho dos veículos e das pessoas que apressadas falavam ao celular, mesmo caminhando.

Ouviu alguem xingar um motorista que invadio a faixa de pedestre

Ouviu também um ¨pega ladrão¨ que ninguém deu atenção. O pivete caminhou tranquilamente e se misturou na multidão que corria para o Metrô, como se fosse o último trêm de suas vidas.

Um carro de polícia parou, mas só parou por causa do engarrafamento do horário.

Sem perceber nada, continuou a desfilar, ligou a sirene

para ter alguma vantagem naquele trânsito, Ninguem se mexeu para dar passagem.

Só foi outro estridente barulho a ferir os ouvidos do velho na janela.

Se lembrou da Paulista dos ano cinquenta.

O que fizeram com ela ?

Onde esta o cafe , lugar de encontros com amigos e brotinhos sonhadoras?

Quantas vezes chorou de amor ali, ao lado de um Cuba Libre.

Hoje tem o Masp bem ali pisando sobre seu passado.

Ta bom que é um Museu que tantas vezes empresta a beleza de genios em pinceladas de cores.

Mas não podia terem escolhido outro lugar?

Definitavente já era de mais, fechou a janela, sem diminuir muito os ruidos, mas era o primeiro passo.

Abriu o guarda roupa e ficou grato por nunca ter jogado nada fora.

Encontrou uma calça Rancheiro, a avó dos jeans.

A bainha ainda estava dobrada no mesmo lugar.

Pegou também uma camisa xadres de manga comprida.

Sobre ela vestiu uma jaqueta de couro preto com ziper

e golas que se cruzavam.

Passou nos cabelos um pouco de Glostora que tirou de um vidro muito antigo.

Olhou no espelho e sorriu com o que viu.

Até seu cabelo ondulado estava de volta a sua cabeça.

Desceu pelo elevador, achou um pouco estranho ele não parecia ter sido reformado ha pouco tempo, suas paredes de formica imitando mármore não estava lá.

Em seu lugar, madeira com entalhes exibia umas sereias saidas de conchas.

O tapete azul que ia até a porta estava novo.

Aquele piso de madeira sintética fora substituido por uma madeira de verdade, um progresso, pensou.

O portão automático de dois estagios que tinha isso por medida de segurança, não estava mais.

Em seu lugar um grande portão com ponteiras douradas, estava aberto para facilitar quem fosse sair ou entrar.

Na rua estranhou o silêncio, um Cadilac rabo de peixe deslisava suavemte pelo calçamento muito bem conservado.

Logo depois um Pacard preto esperava o sinal abrir para continuar.

Um policial vagarosamente se aproximou,num cavalo tordilho com a crina trançada.

Ele olhou para o jovem e sorriu, acenando a mão com um sonoro boa tarde.

O bonde Avenida passou barulhento, ele notou o cartazete novinho da Cera Parquetina.

Depois que o bonde passou,viu em sua frente o Café Trianom, nada de Museu de Arte Moderna.

Atrás de um arco estava a entrada tão sua conhecida.

Estacionadas na calçada estavam quatro Lambreta e duas Vespas, todas novinhas.

No fundo ainda estava a terraça de onde se via o reinaugurado tunel da Nove de Julho.

Novamente prestou atenção ao movimento.

A Avenida era de uma paz, alguns carros trafegavam

quase solenes, pode ver um Buick entrando no tunel.

Sentou-se a uma mesa de vime com tampo de vidro.

Um garçom de uniforme branco se aproximou solicito.

O senhor vai tomar alguma coisa, seu Cuba de costume?

Olhou para o rosto sorridente do jovem e o reconheceu.

Olá disse contente, Jorginho, como vai sua mãe?

Com um jesto de cabeça agradeceu a pergunta, está bem graças a Deus, esta tomando Penicilina e ja se sente melhor.

A tarde deitava-se sobre a cidade.

Não estava acreditando mas não valia a pena contrariar

os acontecimentos.

Terminou sua bebida deixando no fundo do copo algumas pedras de gelo.

Se ecaminhou para a saida, botou a mão no bolso e não achou dinheiro algum, só um chaveiro onde uma mulher pelada dançava quando ele o balançava.

Olhou para o caixa e afastou as mãos para dizer estou duro.

Nem um problema, outro dia o menino paga, o portugues dono da casa não pareceu se aborrecer.

Meio sem graça foi saido de cabeça baixa.

Olhou novente para o chaveiro e o identificou, era o chaveiro de sua Lambreta, tinha sido um presente de sua prima, o chaveiro e a Lambreta.

Com destreza subiu na maquina.

Instintivamente acelerou em direção ao Paraiso.

Logo estava na Aclimação, sem transito eram apenas alguns minutos. À luz do poente a fonte do largo Polidoro brilhava como ouro.

Pensou, eram mesmo anos dourados.

Estacionou e lentamente imitando Robert Michum caminhou para um banco de cimento com a propaganda

de um xarope no encosto.

Estava ali enamorado da vida que não percebeu a chegada de seus amigos. Os amigos chegam e partem sem aviso.

Reconheceu o Sergio, o Paulo e mais atrás o Roberto Rosa Nova, nunca esqueceu esse nome, porque o ligava a irmã do amigo, uma morena de olhos verdes.

Estavam animados com a festa no proximo sabado na casa da Maria Licia.

Começou a imaginar dançando um bolero com a Ivete.

Depois falaram de sonhos, dos estudos, do que pretendiam ser na vida.

Ele ouviu e disse timidamente, quero ser poeta.

Todos riram e o Sergio disse, meu amigo sonhador, você ja é poeta.

Foi chegando a hora do jantar e cada um se despediu.

O Boris que chegou por ultimo foi o primeiro a se retirar.

Estava sempre esfomeado.

O Ulisses imitando o campeão de boxe Rocky Marciano ameaçou um soco no estomago dele. Ele se pos em guarda mas ficou nisso.

Depois que todos partiram, ja era noite, montou na Lambreta deu a partida com o pé na manivela lateral.

ao ruido do motor a luz do farol se acendeu automaticamente. Afastou os cabelos da testa, não se usava capacete e acelerou com um malabarismo para impressionar e chamar a atenção de duas garotas que atravessavam a rua.

Voltou pela Avenida Aclimação dando uma olhada num sobradinho a direita para ver se tinha a sorte de ver a Lígia. A casa estava iluminada, só isso.

Entrou na Paulista e se aproximou do prédio

O portão ja era outro e a Paulista com seus neons acesos, voltava a loucura.

O porteiro ao ver o senhor idoso em trajes estranhos, peguntou, o doutor comprou uma Lambreta? Não se ve muitas hoje em dia.

Ele passou pelo primeiro portão de segurança dizendo. comprei para meu neto, em um leilão de antiguidades.