UM CARANGO MUITO VELHO

UM TRIBUTO A UM VELHO AUTOMÓVEL

Meu primeiro carro era velho e feio. Tão feio que meu filho tinha medo dele. Quer exemplo maior de feiúra?

Além da falta de beleza dava muito problema de mecânica. Deixou-me na rua muitas vezes. Quebrou, foi para a oficina, quebrou de novo. Essa era a rotina. O motor tinha, pasmem, 32cv de potência, menos que uma motocicleta dessas simples, que andam pela rua atormentando a todos com seus escapamentos abertos.

Aprendi a dirigir nele. Tinha o volante duro. Era muito lerdo e fraco. Em qualquer subida que ele enfrentava eu me tornava religioso; rezava fervorosamente para ele conseguir subir em qualquer rampa. Nem precisava ser muito inclinada.

Meus amigos tiravam sarro. Uma vez eu falei que ia trocar o óleo dele e um colega me aconselhou: - Fique com óleo e troque o carro.

Bateu e foi batido. Certa feita, um cavalo em disparada, assustado com os soldados que faziam o recolhimento da bandeira nacional, na frente do Palácio Iguaçu, subiu no capô dianteiro quebrando o pára-brisa com a pata. Muito azar, pois se tratava do último dia do Ford Taunus em minhas mãos. Eu estava me dirigindo a uma loja para entregá-lo em troca de um fusca pé de boi, 17 anos mais novo.

Em uma ocasião estávamos passeando com ele e alguém perguntou: - Não dá para ir mais rápido? Eu respondi: - Dar dá, mas onde a gente vai deixar o carro?

Embora feio, velho e fraco eu não me esqueço dele. Quebrou inúmeros galhos. Meu filho ficou doente e ele, como um bom amigo, não nos deixou na mão naquela hora difícil. Fez o trajeto residência hospital inúmeras vezes sem falhar.

Os domingos eram mais alegres com dele. Sem contar que foi o passaporte para a aquisição dos demais automóveis que eu tive.

Passaram-se alguns anos e eu nunca mais vi o meu velho amigo. Até que, num determinado dia, no Abranches, perto de onde hoje é o Parque Tanguá, eis que avisto o velho carrinho, sem vidros, sem rodas, sucateado, encostado junto a uma cerca de uma casa simples.

Pelo espelho retrovisor, despedi-me do velho Taunus com um sentimento de saudade e tristeza.

CLEOMAR GASPAR
Enviado por CLEOMAR GASPAR em 12/01/2012
Reeditado em 20/03/2021
Código do texto: T3436547
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