... lhe atravessou o pescoço até o coração.
E foi em meio a um dinheiro que ganhei com tal esforço que em ordinário comprei minha armadura. Mandei em medida a que se faça um escudo reluzente. Minha lança ascendente desfere com honra golpes mortais. Meu elmo é pomposo de reles metais, onde protege com destreza minha caixa de pensar. Há de se imaginar como são as Flores Cataudas que desabrocham no leito do lago da mão negra: és meu brasão em escudo de vida renhida. Já chega a hora de partida, é hora de ir.
Apeei meu cavalo em dorso coberto por fazenda em tons claros e alegres. Parto a procura de batalhas, torneios onde poderei competir com bravos cavaleiros, honrosos e leais, desfrutando de suas forças brutas ao despojar-lhes golpes mortais.
Pirilampo-me em campos verdes, onde o céu se mantém limpo por toda extensão, ouvindo apenas o trinar dos pássaros o ruído dos ventos e o cavalgar de meu cavalo... e o balançar da armadura.
Peço asilo em um castelo perto da pedra Dimitre, onde adiante mora um cavaleiro de tanta nobreza que já quatro dos mais fortes e belos cavaleiros que por aqui se aventuraram, tiveram seu elmo partidos ao meio e suas cabeças emanadas por sua espada. Acabei de me armar amazona, oportunidade mais doce não chegaria tão cedo.
Arranja-se a peleja entre Dom Heitor de Algazár e Lady Ana a Justa. Barões e viventes da redondeza vieram para está querela.
Preparou-se Dom Heitor. Tinha Mécia, sua senhora, lhe fornecido um bom cavalo e armadura. Entra em campo, convicto.
Viu-o Lady Ana a Justa e imediatamente apontou sua lança para ele, Dom Heitor também enristou a sua e atirando-a logo de sua montaria a baixo. Foi grande a algazarra da multidão, alguns bradavam: “Arrancai-vos sem amercear o pescoço de Lady Ana Justa!”. Quem ficara contente era Mércia. Lady Ana a Justa levanta-se, desembainha sua espada. Lançam-se um contra o outro com tamanho ímpeto que ambas espadas foram bater contra os escudos. Descarregavam eles golpe sobre golpe. Escorria sangue de Dom Heitor pelo chão. Fracos, ela lhe desferiu tal golpe que saltaram grandes estilhaços de seu elmo, tornando a cabeça rolante de Dom Heitor ao chão.
Era Lady Ana a Justa, uma guerreira manhosa e diante de sua maneira insidiosa de combater, fazia com que os demais cavaleiros tivessem cautela. Era ela ardilosa com a lança, punha abaixo qualquer valente guerreiro. Diante de tão nobreza que carregava consigo, era respeitada por todas as partes. Foi presenteada certa vez com um o escudeiro leal do rei Abdera. Barôba era o seu nome, que dera sua vida por ela sem pensar. Desde sempre, ela teve um grande apresso por cavalaria, pela nobreza montada. Seu sonho sempre fora sentar a cadeira perigosa.
Rei Comanha de Nacabis, das terras de Chipres Angolanos, ouvistes em trovas, feitos mais ardilosos que os seus: Era Lady Ana a Justa de reino que nunca se ouviu falar. Mandara a encontrar para uma justa final, pois estava decidido a matar ou morrer. Foi ao encalço da amazona, que não tardou muito a aparecer por espontânea vontade.
Depois de lhe darem um quarto e lhe prepararem um banho quente, adormece por trinta minutos. Logo é despertada para um banquete e no mesmo encara pela primeira vez o Rei Comanha, que a recebe calorosamente.
- Senta-te bela donzela! Toma vinho de minha melhor safra, coma as frutas mais doces e os manjares mais divinos. Sirva-se dos bezerros mais saldáveis e macios, delicia-se de ambrósia.
Assim o faz, Lady Ana, pois em longa cavalgada, se encontrava faminta. Após terminarem o banquete, ela se pôs a falar:
-Bem, meu caro rei Comanha, já sei de seus grandes feitos, grandes torneios, todas vencidos. Me diga por hora, o que deseja com minha presença?
- Pois que, Bela Dona, saiba que este banquete é o ultimo de um de nós. Amanhã de manhã chegará a seu quarto sua armadura, lança, escudo, elmo e espada embainhada. Tudo em ótima qualidade, assim como as que eu usar. E um corcel branco lhe aguardará no campo de batalha, onde entrarei em um appaloosa negro e armadura também da mesma cor. Ninguém estará em desvantagem, posso lhe assegurar. Mas uma coisa não vá se esquecer, é justar ate morrer.
E brindaram os dois a essa ultima batalha e talvez a mais sangrenta. Ambos estavam cientes dos feitos de cada um, sabiam que tanto quanto matar, morreras. Estão inebriados, entorpecidos. Cantam, dançam, riem como se não houvesse amanhã. E sem trançar as pernas, retornaram cada um a seus aposentos. Pensamentos vis percorrem o quarto esta noite. Mas não tarda muito para que moram em sonhos.
“ Mas que campos cheirosos. Gosto de cavalgar por aqui, a grama é muito verde, rente ao chão plano, com flores e arvoredos. Vem um roliço bagre, que se aproxima e transforma-se em um gordo homem branco. Pede atenção. Coloca as mãos sobre a cabeça sem toca-la, entorta o pé esquerdo, flexiona mesma perna, gira a direita em noventa graus a levanta. Aponta para o adversário e vai! Voa voadora, voa com o impulso da mente. ‘Pense em mim na hora da justa e vença honrosamente.’ O gordo se fez bagre novamente. Pegou um revolver e deu um tiro no meu joelho. Cai ao chão. ‘ É uma pena, não poderá combater, agora”, ri desenfreado o bagre.”
Acorda de súbito: ufa! Foi só um sonho.
Amanhece, Dom Comanha e Lady Ana a Justa se preparam. Banham-se, se alimentam, se armam e descem para o campo de guerra que como o combinado, uma ótima montaria os aguardava. Realmente todas as armas, armaduras e cavalos, eram ambos da melhor estirpe. Montaram. Havia uma multidão silenciosa. É tocada a gaita. Os dois se atiram com violência um contra o outro com lança empunhada. Os escudos partem ao meio, batendo ambos contra suas lanças. Lady Ana desembainha rapidamente sua espada e lança-se feroz sobre Dom Comanha. São lançados ao chão. Ela aponta sua espada para a cabeça de Comanha, que está ao chão: “Rende-te cavaleiro!” Gritava ela em tom de fúria. Lhe oferecendo o pescoço, Dom Comanha responde: “Prefiro a morte que a desonra. Mata-me nobre amazona!” Ela da um passo para trás, permitindo que ele apanhasse sua espada e se lançou com força apontando-a para seus olhos, que recuaram, salvando-se deste golpe fatal. Os dois combatem em chão por mais de duas horas. É dado um descanso de trinta minutos.
Sobem em suas montarias e lança e escudos novos lhes são dados. Se chocam com tamanho ímpeto, mas não caem ao chão, rodeiam o campo, cansados. Jogam-se um contra os outros. Jorra-se sangue por toda parte.
Dom Comanha desce do cavalo, põe as mãos sobre a cabeça sem encostar, entorta seu pé esquerdo, flexiona a mesma perna. Gira a perna direita em noventa graus e a aponta para Lady Ana a Justa, mas não consegue voar voadora. Desarmado, pega seu revolver e da um tiro no joelho do cavalo de Lady Ana, que cai e derruba ela ao chão. Em um milésimo de distração, ela teve sua cabeça partida ao meio. Dizem que a espada de Dom Comanha lhe atravessou o pescoço até o coração.