Casamento Contemporâneo.

"Vou parcelar em doze vezes", disse Pedro ao dono da joalheria.

Eram as alianças mais bonitas e caras da loja, e o dia mais importante da vida dele. Débora finalmente seria sua esposa, depois de alguns anos juntos.

Pedro apareceu sem avisar no apartamento dela naquele dia, e após um beijo frio, foi surpreendido com um "É o fim pra nós dois, acabou!"

Desecreditou da situação e passou alguns minutos transtornado, a questionando sobre o fim. Ela foi clara:"Não sei o que quero mas tenho certeza de que não quero você. Não dá pra entender isso? Por que é tão absurda a ideia de alguém simplesmente não te querer sem precisar de um motivo para? Cresça um pouco. Você não é insubistituível, nunca foi indispensável. Por favor, saia que eu preciso dormir".

Pois é, pior troca que alguém pode viver é a que é feita pelo nada. Ela não tinha outro amor, não se sentia sufocada com o relacionamento. Pedro a comia como ela gostava todos os dias, e ela simplesmente não o queria mais. Isso dói. É difícil de aceitar e mais ainda de entender. A insubstituível mulher de sua vida e até então futura mãe de seus filhos estava agora o trocando por um travesseiro e algumas horas a mais de sono.

"Tá certo", disse Pedro levantando-se e saindo pela porta do quarto de Débora.

Ela acabou dormindo.

Enquanto um monstro acordava dentro dele.

Débora era uma pessoa difícil, não costumava aceitar a idiotice alheia muito bem (o que tornava-a por vezes idiota, por se importar tanto). Possessiva, de uma sinceridade cínica. Pessoas pra ela precisavam ter uma utilidade ou ela não as precisava mais. Como Pedro (E Gustavo, Paulo, Henrique, Rafael, Allan, Guilherme, Diogo...). Saiu da casa da mãe aos 16, se apaixonou pelo namorado da irmã, deu pro marido da amiga, pegou a mulher do amigo, já havia feito um aborto e usado algumas drogas. Mas era uma pessoa boa, dependendo do ponto de vista. Apaixonada por crianças e arte. Cozinhava bem, porque a necessidade a fez assim. Não a creditava mais no amor, a vida a tornou assim. Era devota à cerveja e ao orgasmo. E trabalhava só pra ter os dois: uma casa pra trepar e uma geladeira pras cervejas.

Pedro queria casar. Morava com os pais pra juntar um dinheiro e então poder dar à Débora a vida que (segundo ele e só ele) ela merecia. E essa mulher agora estava ali, jogada numa cama acompanhada de uma garrafa de cerveja. Preferindo ouvir suas músicas à voz dele, uma garrafa de cerveja à sua boca.

Ele não era um cara violento, embora as paredes do seu quarto já tivessem algumas marcas de sua mão direita. Socava-as vez ou outra pra não fazê-lo na cara das pessoas com quem convivia. Um cara legal.

Por um instante pensou em estrangulá-la de tanta raiva, mas lembrou que aquela piranha gostava de apanhar e isso não adiantaria em nada. Se sentiu traído. Não por outros homens, mas por outros planos. Lembrando daqueles (os planos) que fizeram juntos, sendo agora trocados por outros ou (pior) por nada.

E o que fazer com as alianças que estavam no bolso?

Se viu apaixonado pela vagabunda que partiu seu coração sem a menor cerimônia.

Até que lembrou que além das alianças, tinha fósforos em seu bolso. E gás na cozinha. E ódio pela casa.

Foi lindo ela tentando abrir os olhos pela última vez antes de morrer e o ouvir sussurando:

"Até que a morte nos separe, meu amor".

nes_ste
Enviado por nes_ste em 23/12/2011
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