Almas
Travesti
Percebi, agora, que realmente estou sozinha no mundo... mesmo tento toda a gente ao meu lado... mesmo que alguma espécie de alma me acompanhe me trazendo cheiros, frio, calor, choro. Tudo isso além dos meus defeitos, trejeitos.
Não decidi nascer assim. Não nasci travesti. Existe um homem dentro de mim. Mas ali dentro só existe fragilidade, conflito. É o homem dominável. Sou travesti irreprimível. Além dos meus defeitos.
O certo é que não sei bem... destas coisas.
Só sei que deveríamos ter sempre companhia para apagar um pouco a nossa solidão intrínseca neste vasto deserto: acho que no fundo, bem no fundo sempre estamos sozinhos conosco e com mais ninguém. Isso dá medo. Não nascemos para a solidão.
Ressentida por ser travesti com um homem dentro de mim. Eu me ressinto pelo hétero que sou. Não gostaria de me sentir heterossexual. Mas sinto porque ele fala sempre, dentro de mim ele me mostra o seu imenso pênis. Queria que fosse de outra maneira. Que meu pinto fosse minúsculo pra eu ser inteira Travesti. Mas não é assim, algo é mais forte. Mas vai longe, estas coisas. E o homem que me habita me deixa cada vez mais só e pior: cada vez mais me afasto de mim mesma em direção à morte. Sentir-se sozinho é, de certa forma, presenciar a morte.
Sei que não precisaria ficar só. Mas não há alternativa: eu que sempre me diminuo e fico só: ele, na sua fragilidade, em não querer ser travesti, me domina. Mas eu, eu ainda sinto a presença das almas que me salvam de mim mesma.