CONTO PODRE
Para onde iam toda aquela gente? Arrastando os pés, em quase fila indiana. Carregavam malas, mal amadas, descabeladas, em roupas rotas e amarfanhadas, com suas crianças sujas, berrando pelo caminho todo a pleno sol irascível. Falavam em pecado, resmungando, sussurrando, cheio de salivas pelos cantos dos lábios gretados. As mulheres tinham pernas flácidas e varizentas e os homens eram pescoçudos e calvos. Todos eram muito infelizes; doentes a cada dia; guardando a sovina migalha nos fundos dos bolsos furados.
Quando as chuvas os pegavam desprevenidos praguejavam, mas contra si mesmos, mas quando era o sol, resmungavam falando em pecado.
Guardavam uma jurássica sabedoria. Lascando letras de formas em pedras com cinzeis, machucando os dedos, esfolando os punhos.
Pouco a pouco percebiam que de nada adiantava reclamar, tampouco solucionaria ficarem silenciados, aparentando conformados e satisfeitos.
Havia atalhos imaginários que conduzia a veredas mais estreitas onde encontravam sombra, se amontoavam, enchiam-se de esperança e fé num fim escatológico, mas sem sinceridade de assim desejar. Odiavam secretamente um ao outro, contudo falavam de amor, amor.
Se perdiam pelo caminho, se encontravam, desencontravam, escondiam as migalhas sovinas nos bolsos furados...
Desse modo assim, assim sempre.