O SAPINHO ENCANTADO

Ao contrário do que se possa imaginar, esta história não se inicia em nenhum habitat mais apropriado para a existência do nosso querido anfíbio enfeitiçado...

Ela nasceu, na verdade nos campos de trigo, quando certa raposa (diria muito simpática, até!), se esgueirando desconfiada deixou-se cativar por um principezinho matreiro. Tenho que deixar claro aqui que esse não era loiro com aqueles olhos parecendo duas continhas azuis. De jeito nenhum! Príncipe loiro é muito emblemático. Era bem moreninho mesmo, como que criado em beira d’água, água de rio com nome de santo.

Bicho cativo é um problema sem fim, porque natureza de bicho é de ser livre e quando acontece de se deixar prender, está perdido... Não sabe o que fazer. A primeira coisa que perde é o instinto de sobrevivência, a noção do perigo. E tem mais: principezinhos ou loiros ou morenos, tem sempre as suas rosas para cuidar...

Bem, sentaram-se os dois em meio aos campos de trigo à distância de mais ou menos... um CLICK e bastou isto para que o processo se desse. Acabou-se o mundo naquele instante. Mas, Principezinho que se preze não faz nenhuma promessa que não possa cumprir e raposa que se preze é inteligente o bastante para não fazer cobranças de promessas que não foram prometidas. Então, tudo acertado: sem promessas, sem cobranças. Foi assim que a história começou.

E o que é que todo esse papo tem a ver com papo de sapo? Embaraçosa esta pergunta. Embora eu não tenha ainda encontrado a ponte estou convencida de que uma história é exatamente a outra e vice-versa.

Cabem outras perguntas inquietantes sobre o tal sentido do texto... O que se quer dizer com... O que a autora imaginou quando... Digo de antemão que ninguém deve se preocupar em adivinhar o que está por trás do revelado. A intenção de quem escreve historinhas como esta é sempre despertar em quem lê, as muitas e variadas possibilidades de interpretação do causo. Então, dê asas à imaginação.

Voltemos aos fatos. Temos que decifrar o mistério da ponte, senão, não há história. Vamos às definições. Tá lá no Aurélio que ponte é uma “construção que liga dois pontos separados por um rio...” Bastou pra mim! Achei a ponte. Ela está é no rio. O mesmo rio que guarda a infância do Principezinho é o mesmo rio que foi a casa do Sapinho, até ele chegar à bolsa onde reside atualmente.

Como é que eu sei que o Sapinho e o príncipe vieram do mesmo lugar? Elementar! Todo sapo encantado, já foi príncipe um dia! A história é por demais conhecida: uma bruxa má, namoricos desfeitos, encantamentos, desencantamentos e final feliz. É assim que acontece e foi assim que se deu.

O Sapinho apareceu numa manhã do mês de outubro, um mês propício a estas aparições. Criaturinha muito interessante, ensimesmada e de poucas, pouquíssimas palavras. A sua língua era tão compenetrada que ao ser perguntado sobre qualquer coisa respondia apenas: Zastrás, Zastrás, Zastrás. Gostei dele logo de cara. A minha amiga Lúdica disse que eu deveria colocá-lo em uma bacia com água para que ele pudesse crescer feliz. Olhei bem para ela e respondi: “Vão me roubar o bichinho!” Ela sorriu muito, ela adora sorrir...

Então foi aí que me ocorreu a idéia da bolsa, que não era amarela, mas bem poderia ser, pois era um perfeito porta-treco. E haja treco pra portar! Na parte externa dela haviam quatro compartimentos e na parte interna, mais 1...2...3...4 divisórias. Perfeito! O lugar ideal para qualquer mulher “exercer o seu direito in natura de ser mulher” (Shhh! Esta fala é de um amigo meu). Ademais, a bolsa quase amarela também era enfeitiçada: Tudo o que se guardava nela, se perdia e depois se achava. Sapo encantado em bolsa enfeitiçada, melhor combinação não há!

Olhei bem para o bichinho carrancudo em minhas mãos e me lembrei de como seria fácil perdê-lo nos campos de trigo... Principalmente se tivesse rosas para cuidar. Decidi mantê-lo mais que bem guardado. Coloquei-o em uma caixa dentro de outra caixa e dei um laço, porque nó, é coisa difícil de se desfazer...

Dediquei-lhe todo o carinho e atenção, dei-lhe tudo de mim... Ele até conseguiu balbuciar algo em sua língua arrevesada. Outro dia, perguntei-lhe se estava bem, guardado daquela maneira, se havia alguma coisa que eu pudesse fazer para torná-lo mais feliz. Sabe qual foi a resposta? “Exista, e sou feliz!”

A minha vontade foi de beijá-lo na hora, mas felizmente lembrei-me do encantamento. Se o beijasse se tornaria um príncipe e príncipes são muito perfeitinhos e eu desconfio de demasiada perfeição. A beleza está sempre nos olhos de quem vê, já se diz por aí. Por isso, decidi: vou deixá-lo Sapinho mesmo... Assim, lindo e encantado em minha bolsa quase amarela.

Fabiana Gusmão
Enviado por Fabiana Gusmão em 13/10/2011
Reeditado em 15/10/2011
Código do texto: T3275030