Dr praxedes

Todos se perguntavam o que houve com o Doutor Praxedes, que não freqüenta mais os lugares de antes.

Ele tinha uma felicidade de fazer doer qualquer um . Que causava uma inveja mortal nos moradores de Maiquinique. Que raio de homem feliz é esse? Doutor Praxedes, onde chegava trazia um sorriso prateado. Como vai, Doutor? Meu filho, melhor estraga, esse mundo não é belo? Aquilo doía dentro do osso. No bar de Aristides, ou no café de Dona Jovita, ele não se misturava. Pedia sua bebida, abria seu revista e sua anotações. Passava a manha em pensamentos e suspiros. O felizinho já esta ai? Desde cedo. É que naquelas bandas não se tinha muitos motivos sorrir.

Uma seca medonha acontecia naqueles lados. Parte grande do rebanho migrado pra outros campos. Muito dinheiro gasto com arrendamento de terras e transporte de carreta. Essa preocupação estava pregada nos rostos das pessoas. A cidade estava amedrontada com a possibilidade da chuva não chegar até dezembro. Todo o comercio e o dinheiro girava em torno da plantação de cana e da criação de gado. Grande parte produção de leite, outra parte, de corte. Cada fazenda tinha sua especialidade. O leite colhido pela manha, era armazenados em gelo, levado pra Itapetinga e la, vendido para as grandes distribuidoras.

Um ano sem chover! Com pode isso acontecer, não é uma porra, perdi mais de vinte vacas só nesse mês. Os urubus rodam e bicam antes mesmo da morte. Gritava lendo o jornal seu Prado Meneses.

Os jovens foram embora, não tem trabalhador, daqui a pouco eu mesmo vou colher o pouco leite que resta, dizia Bento Amaral, um velho que ninguém julgava ter dinheiro, pelo desleixo que andava, e da forma que falava. Doutor Praxedes, não se alimentava dessas conversas. Sentado a mesa em volta desses problemas ria. Dona jovita, me traz mais um café? Nunca vi um dia tão colorido ,percebe isso? Pela porta, se via mesmo um colorido assanhado, o céu se perdendo num rosa envolto de nuvens ralas. Numa imensidão que dava medo em quem olhava.

Era verdade, o dia estava bonito se olhasse apenas pra cima. Por que ele não olha pra baixo. As terras que estão rachadas, ralhava seu Raimundo Pires, que perdeu o emprego de capataz e voltaria a trabalhar somente quando a chuva viesse. Doutor, o que lhe mantém tamanho entusiasmo, nunca vejo o senhor infeliz? De longe, José Gonçalves numa voz carregada de ironia. Meu filho, é que você não vê ou não dá motivos às belezas que estão a sua volta, pensam muito em perdas, pensam em dinheiro. Se não chove é porque o momento é esse. E nessa seca, pela ausência de facilidade, a vida se revela bem mais valiosa, não pensa isso?

A vontade era expulsar o imbecil do bar. Mas quem é doido de fazer isso? Doutor Praxedes, a pesar de tudo era muito prestativo quando o assunto era doença, todos já cansaram de arrancá-lo da cama às meias noites, quando a doença chegava em suas casas. Em na sua profissão era um coração grande. O que perturbava era esse entusiasmo beirando a loucura de não ver que tudo estava se perdendo.

Se a seca continuar doutor, a cidade vai fechar. Todos aqui vamos embora, e o senhor não vai ter pra quem exibir esse sorriso. Não vai ter pacientes e esse café gostoso que toma todos os dias aqui, vai ficar difícil de pagar. É um doutor, não fala assim, dizia dona Jovita, que até hoje se sentia honrada de ter um médico no seu comercio. De merda! Baixinho Prado Meneses retrucava. Grande coisa é medico, num telefonema e vem dez trabalhar aqui. Doutor, o senhor que um torta acabei de fazer, falava a velha querendo concertar a fala negativa, acreditando que qualquer fala mesmo que baixinho chegava na pessoa.

Me diga doutor, e sua fazenda, como está indo? Fiquei sabendo que a coisa lá ta feia também. É verdade meu filho, a produçaõ praticamente zerou. To gastando minha economias pra manter as cabras com ração. Isso não afeta o senhor. Sim, tenho pena de minhas cabrinhas, vejo muito triste, a ração tira o brilho dos olhos dos bichos, o senhor não acha? Gosto de ver as cabras pulando, berrando, rolando na relva, tenho falta disso, porque uma de minhas alegrias era ir para a manga e ver as bichinhas se divertindo.

O senhor não tem jeito, não sei porque perco meu tempo com suas conversas, quer saber doutor praxedes, o senhor me desculpe, já precisei muito do senhor e agradeço, sou muito grato. Mas não aproveito nada que sai da boca do senhor, vai lá, a felicidade das cabras, o olho brilhantes dos bichos, que raio de vida o senhor leva, que mundo o senhor frequenta. Parece que vive num mundo de mentira. Juro que não tenho vontade de conversar com o senhor, porque suas conversas não me acrescenta nada.

Aquela fala de Berlindo Cunha, deixou todos calados, profudamente quietos e contrangidos. Berlindo disse o que todos gostariam de dizer. Mas dizer isso pro Doutor, falar coisas fortes desse jeito, um homem que saia no meio da noite, no frio ou na chuva, pra fazer partos, curar febre e morredeira, dar esperança a tantas noites sem vida . O velho praxedes levantou como se tivesse caido numa realidade que não conhecia.

Pois bem, seu Berlindo, o senhor fala bem as coisas que pensa, eu acho bonito isso num homem. Pegou seu chapeu, foi até o bar, pagou a conta do mês. Dona jovita, como sempre seu café estava perfeito, adorei a torta, colocou o chapeu na cabeça e andou até a porta. Todos olhava aquele homem feliz indo embora. Num instante, saia dali a única pessoa, que tinha a força de olhar pela janela e ver o céu forte e voraz que cobria aquela terra seca.

Ariano Monteiro
Enviado por Ariano Monteiro em 30/08/2011
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