Lázaro

- Lázaro, vem para fora!

Lázaro já estava há quatro dias sepultado. Suas irmãs e amigos ainda choravam sua morte prematura. Para suas irmãs, Lázaro morrera por descuido ou indiferença de Jesus, seu amigo. Jesus operara tantos milagres na Judéia, mas quando partira não pode ajudar seu amigo. Alguns cochichavam entre si dizendo: “Esse que abriu os olhos do cego, não poderia ter feito com que ele não morresse?”. Marta quando viu Jesus, lamentou: “Senhor, se estivesses aqui, meu irmão não teria morrido”.

- Lázaro, vem para fora!

- Não!

- Lázaro, você precisa sair. O povo necessita da glória de Deus. O povo precisa saber que eu sou o Filho de Deus.

- Eles já sabem...

- Não, eles não sabem, eles não sabem crer, precisam ver.

- Como o senhor pode me pedir uma coisa dessas? Nem mesmo Moisés negaria a glória de Deus... E o Senhor vem pedir a mim? Quem sou eu neste mundo? Nada... Nem mesmo Moisés, quanto mais a mim...

- Lázaro, eu sei o que você está sentindo, sei que é difícil resistir essa sensação de conforto, de segurança, mas é preciso.

- Não! Não me peça isso! Sabe, é a primeira vez que realmente me sinto vivo... É a primeira vez que sinto Ele, sabe...?

- Sei, mas você tem que ser forte.

- Não, eu não sou forte, não sou como o Senhor... Sou humano, humano, apenas humano... Deixe-me morrer essa morte feliz, porque a minha vida, esse mundo, não, eu não quero, não me peça isso, meu amigo...

- Mas o povo precisa, suas irmãs precisam, você não pode ser tão egoísta em não revelar a verdade.

- Não, eles saberão... Do jeito deles, mas saberão...

Jesus sabia que não poderia incriminar Lázaro. Estar diante da glória de Deus é algo maravilhoso, é como experimentar pela primeira vez a vida, a vida verdadeira. Entendia Lázaro, entendia que por ser tão humano jamais abriria mão daquela maravilha. Precisava ser insistente, pois aquele era um momento único para provar àquela gente que Ele tinha sido enviado por Deus, seu Pai. Ressoava em sua mente as vozes das pessoas, cobrando milagres, cobrando uma postura digna de um Messias. Aquela gente precisava de algo palpável e não apenas palavras bonitas sobre o Reino de Deus. Isso os poetas já faziam, ele tinha que insistir com Lázaro.

- Lázaro, vem para fora!

- Por que o Senhor não espera outra morte, de alguém mais preparado, por exemplo um sacerdote... Certamente, será mais prestativo ao Reino de Deus e a essa gente incrédula...

- Não, tem que ser você, tem que ser agora.

- Não sei, tenho medo de voltar...

- Por quê?

- Porque posso me apegar de novo a esse mundo, a essa gente e minha sorte não ser melhor que essa...

- Impossível, Lázaro.

- Não, nesse mundo tudo é imprevisível e muito mais nós...

- Lázaro, você confia em mim?

- Senhor, não faça isso...

- Você confia?

- O Senhor sabe a resposta, o Senhor sabe todas as coisas, ninguém lê tão bem o ser humano como o Senhor, mas deixa seu amigo seguir seu destino...

- Não, Lázaro! Esse não é o seu destino é apenas o início de tudo. Ah, se eu pudesse te contar todas as coisas, não que eu não possa, mas você não entenderia, nem você e nem essa gente. A incredulidade é uma grande barreira à verdade.

- Senhor, não me entenda mal, não desejo toda a verdade, apenas essa glória me basta... Isso é tudo, é a verdade, é tudo...

- Não, Lázaro! Isso não é tudo, o tudo sou eu e você sabe disso.

- Sei, mas...

- Sem mas, Lázaro, você tem que sair. Não adianta insistir, a glória pode esperar, mas o povo não, o povo tem sede, tem necessidade de ver. Eles precisam desse milagre, eu e o Pai precisamos.

- Eu sei...

- Então, vamos?

- Só mais um momento, por favor... Nunca poderia pensar que tudo seria assim, tão, tão...

- Perfeito?

- Não, indescritível...

Nesse momento, Jesus ergue seus olhos aos céus e diz: Pai, dou-te graças porque me ouviste. Eu sabia que sempre me ouves; mas digo isso por causa da multidão que me rodeia, para que creiam que me enviaste. Dito isso, vira-se novamente a sepultura de seu amigo e grita:

- Lázaro, vem para fora!

Lázaro aparece na entrada da gruta e como se visse pela primeira vez o mundo, vira-se para Jesus e concede-lhe um sorriso amarelado, mas com muita ternura. Jesus vira para a multidão e diz:

- Retira as faixas de Lázaro, eis aí o milagre que tanto queriam, Lázaro nasceu de novo. Espero que assim não haja mais dúvidas. Talvez ainda seja necessário algo maior para que esse povo acredite, talvez ainda desejem a ressurreição do próprio Filho.

E virando para seus discípulos, disse-lhes:

- Vamos, porque o tempo é curto...

Rodiney da Silva
Enviado por Rodiney da Silva em 08/08/2011
Código do texto: T3147151
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