Yoga Fire

Eu já tinha sentido de tudo - letargia, euforia, nojo, indiferença, ternura - depois de trepar com uma semi-conhecida, mas a tensão que pairava no ar e embaçava os espelhos e as vidraças do quarto de motel me jogaram num estado de inquietação nunca antes por mim experimentado.

Tinha muita coisa em jogo, por fora, enquanto estávamos dentro um do outro.

A sobriedade que sobreveio ao orgasmo poria todo o jogo de sedução, todas as promessas de gozos descabidos e eternos, na sarjeta?

Estávamos a um tempo considerável em lados opostos da cama - acabamos num 69 - sem dizer palavra. Eu olhava seus pés, coxas e, ah!, o trunfo-mor: a baita bunda bem esculpida de mulata, que horas antes eu contemplara pela primeira vez como se fosse uma esfinge.

Teria sido carnalmente bom pra ela, como o foi pra mim?

Peguei no sono.

Acordei com o barulho do salto-alto. Abri os olhos. Ela já estava vestida com sua roupa clássica, sóbria, tradicional, social...

Pergunto se foi um erro o que fizemos.

Ela sorri em resposta, mas seus olhos estão tristes.

"Foi... Mas foi maravilhoso!"

Claro.

"Eu nunca fiz em toda a minha vida muito do que fizemos aqui nessas duas horas"

Esperei pelo pior. Pelo de sempre.

"Mas foi um erro o que fizemos", disse, "mentimos pra tanta gente...!"

"Sei", respondi.

Fechei os olhos, suspirei. Por ter tanto o que falar, eu não tinha o que falar.

"É essa a sua resposta pra tudo o que aconteceu?"

Não respondi.

Ela fechou a cara, pegou a bolsa e saiu marchando porta afora, balançando aquela anca de outro planeta.

O telefone toca. Atendo.

"Sim", respondi ao recepcionista, "estou vivo. Apenas brigamos e eu vou sair depois"

"A conta já está paga, senhor", disse ele.

"Tudo bem", respondi.

Rolei pro lado errado e cai da cama, batendo o quadril no chão.

Subi na cama novamente, deitei com a barriga pra cima, fitando-me no espelho do teto.

Não conseguia entender o risinho que estava costurado nos meus lábios, quando por dentro eu desmoronava aos poucos em remorso.

Desmoronava, porque novamente estava sozinho.

De novo.

03/08/2011 - 13h10m

Rafael P Abreu
Enviado por Rafael P Abreu em 03/08/2011
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