Lavando Trouxas

Duas costureiras conversando:

-Ei! Pega mais algumas trouxas para eu costurar – diz Maria.

-Você esta querendo fazer demais, esses trapos aqui só precisam de um remendo mesmo e depois é só darmos um banho com sabão que estará bom. – Diz Julia.

-Mas é que são muitas trouxas para costurarmos e elas podem mofar, não...

-Relaxa, sem problemas algum, qualquer coisa, se mofarem, é só lavarmos ela como eu disse.. Você sabe não é? Trouxas são assim mesmo, não precisa fazer muito que já está bom.

-Sim.. mas ainda temos aquelas roupas de marca ali, elas darão mais trabalho para nós.

-Sim! Por isso não quero ficar enrolando muito com esses trapos velhos, teremos mais trabalho com aquelas ali, elas não podem manchar na hora de lavar, e temos que fazer uma ótima costura para parecer que foi comprada da loja agora..

-Sem falar que se o trabalho não for bem feito os clientes não irão pagar e será um prejuízo para nós.

-Com certeza! E eu não quero perder esses clientes, não são muitos, mas os que têm pagam muito bem.

Maria pega algumas das trouxas:

-Eu irei levar essas trouxas para lavar que estão um pouco sujas.

-Tudo bem, e depois que por elas para lavar, vá comprar mais linhas para costura, estamos precisando de umas linhas azuis e amarelas, compre dez carretéis de cada.

-Onde esta o dinheiro para a compra.

-Pegue naquela segunda caixa em cima da estante.

Maria pega a caixa e exclama:

-Menina! Quanto dinheiro! Nós costuramos bastante..

-Que nada, esse dinheiro vem dos bolsos que acho nas trouxas.

-Mas nós não deveríamos devolver para os donos?

-Que nada menina! Eles nem percebem, nem sabem que tem esse dinheiro ai.. e outra, assim podemos comprar coisas boas para nós como aquele milk-shake caríssimo que você sempre quis experimentar.

Maria sorri e completa:

-Pode deixar que eu trarei um de morango para você.

Ela pega o dinheiro, sai da loja e vai direto para a loja comprar as linhas que estavam precisando para fazerem as costuras e no caminho ela vai vendo as pessoas passarem, vê vários clientes dela também e Maria pensa:

‘’Como eles conseguem andar com esses trapos? O filho daquela ali então, veste as roupas da escola que foram passadas do irmão dele e eu lembro, que comecei a trabalhar na loja, e já me passaram essas roupas... ’’

Mas seus pensamentos são interrompidos quando uma mulher pára na sua frente:

-Moça! Moça! Você é a costureira do bairro não é?

-Sim, sou eu mesma.. Por quê? – Responde querendo se afastar um pouco da mulher.

-Minha única blusa de frio rasgou e preciso de um conserto nela, mas moça, eu não tenho dinheiro para pagar, será que você podia me fazer esse favor? – Pergunta a mulher com uma cara de coitada.

-Não sei se podemos fazer fiado – Maria pensa um pouco e responde – Passa lá na loja e pergunta pra dona, a Julia, e acerta com ela.

Mudando o humor a mulher faz uma cara mais brava:

-Pode deixar, irei falar com ela. - A mulher sai com os ombros levantados e com pressa.

-Vai entender essas pessoas.

Maria apressa o passo e entra na loja:

-Boa tarde, com o que posso ajudá-la? – Pergunta a recepcionista da loja.

-Estou... – Ela para de falar e toca um objeto – O que é isso?

-Isso é um novo tipo de agulha, ela é grande porem leve e de fácil manejo. O pessoal tem comprado bastante, falam que é mais barato costurar em casa do que mandar para a costureira e ainda tem o curso... – Mas é interrompida por Maria.

-Tem curso também, que interessante... – Maria fica olhando a agulha por um tempo e a recepcionista conclui.

-Você esta interessada na agulha e no curso?

-Não, Obrigada! Vim aqui para comprar algumas linhas mesmo. – responde Maria pensativa

-Que cores você gostaria?

-Preciso de dez carretéis da cor amarela e dez da cor azul.

-Só um minuto! – a recepcionista põe em uma sacola os carretéis – são três reais moça.

-Aqui está e obrigada! – Maria pega a sacola e começa a se dirigir para fora.

-Obrigada eu! E volte sempre! – Diz a recepcionista sorrindo.

Maria sai da loja e começa a andar com pressa, ela se dirige para a sorveteria para comprar os milk-shakes, ela entra na loja e pede com pressa:

-Dois milk-shakes, por favor!

Um menino a atende:

-Quais os sabores moça?

-Um de chocolate e outro de morango.

-É pra já!

O menino sai do balcão e começa a preparar os milk-shakes e Maria fica observando ele e pergunta:

-Menino, quantos anos você tem?

-Onze anos moça.

-Não tem nenhum adulto cuidando do lugar?

-Meus pais foram ver umas coisas por aí e já devem estar voltando, enquanto isso eu cuido daqui mesmo, já sei fazer o trabalho. – Ele coloca o primeiro copo na frente de Maria.

-Você não preferiria ficar brincando com as outras crianças em vez de estar aqui?

-Sim! Mas meus pais não estão e tenho que ficar aqui. – Ele põe o segundo milk-shake em frente de Maria – São sete reais moça!

-Aqui está menino!

Maria paga os milk-shakes e se despede. Ela apressa o passo e vai direto para a loja procurando Julia:

-Julia! Julia! Lá na loja, onde comprei as linhas, estão vendendo algo novo – fala Maria com pressa.

-O que estão vendendo menina? – Pergunta Julia preocupada.

-Estão vendendo um tipo de agulha nova, que facilita as pessoas na costura e também tem curso pra aprender a usá-la!

-Menina, isso é um problema para nós! Se todo mundo comprar, não teremos mais clientes! – Fala pensativa.

-O que faremos Julia?

Julia pensa por um instante e responde:

-Tenho alguns contatos na agenda –ela suspira um pouco e continua – teremos que fechar o negócio deles.

-E como seus contatos farão isso?

-Não sei! Depende deles, talvez botem fogo, talvez façam a dona sumir, não sei Maria.

-Julia! Não podemos fazer isso. – Fala Maria espantada.

-Negócio é negócio Maria, nós não podemos deixar que isso continue, senão no futuro teremos que fechar o nosso.

As duas não falam mais nada e tomam seus milk-shakes e voltam a costurar as trouxas.

No dia seguinte Maria chega à loja e Julia comenta:

-Já fiz as ligações, hoje mesmo já darão um jeito naquela loja.

Maria para um pouco, suspira e fala:

-Estou me demitindo Julia!

-Como? Você não pode fazer isso logo agora!

-Não posso continuar com isso!

Julia pára por um instante e depois de um tempo olhando para Maria responde séria:

-Está certo menina, mas não se esqueça, ninguém pode saber do que irá acontecer, e se alguém vier atrás de mim, eu saberei quem punir.

Maria treme um pouco, mas com firmeza responde:

-Eu não irei te denunciar. Me decidi que irei sair daqui e da cidade para não viver com isso. - Maria pega suas coisas e continua – e também não irei mais mexer com trouxas, nunca pensei que esse negócio podia ser tão complicado e também chegar a ser perigoso – ela suspira e conclui – Até mais Julia!

Maria pega suas coisas, sai pela porta e nunca mais volta à cidade.

Alguns meses depois em uma campanha de agasalhos:

-Aqui dona Joana! Com a campanha arrecadamos todas essas roupas para e você e sua família – entrega Maria sorrindo para a mulher.

-Muito obrigada Maria, você é um anjo! – a mulher pega as roupas e sai chorando ao lado de seus sete filhos.

-Quem é o próximo? – pergunta Maria sorridente.

Ao fim da tarde Maria pega suas coisas e começa a ir embora quando ela se distrai com um jornal velho ao lado de suas coisas e ela se espanta com o que lê:

‘’Dona de loja morre em incêndio em sua própria loja’’

Maria para por um instante e pensa:

‘’Prometi que não iria fazer nada contra isso, mas prometo ajudar a todos aqueles que usam trouxas’’

Maria joga o jornal fora e vai embora com uma nova missão pela frente.

DARodrigues
Enviado por DARodrigues em 18/07/2011
Código do texto: T3103040
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