Jardim de Platão

No dia de meu casamento papai disse: Seja feliz, Marta - Seu tom de voz saiu tão grave, talvez, para dar a veracidade em uma frase comum. Assim, casei-me aos dezessete anos, sem opinião formada e nem amor confirmado, com o homem que possuía uma fazenda e uma fábrica de carvão no extremo leste de São Paulo. Sai de Minas e para lá fui, na época, só havia pequenas casas, riachos e estradas lamacentas. O centro da cidade, não conheci.

“Sortuda, arranjou homem bom” falava senhoras, solteiras, viúvas e mulheres de vida fácil, homem bom deveria ter posses, não eram discutidas qualidades imateriais. Antonio, era assim que se chamava, temos sorvete? “Queremos vinho.” Eu disse: Quero amar-te! Ele dizia: “Vou para a fábrica.” Antonio, só quero uma rosa. ”Cale-se mulher, tenho negócios a tratar.”

A sorte é uma é uma felicidade mesquinha, egocentrista que para os pessimistas é plena ilusão do senso comum, ou de quem há de ser. Bem, paremos com essa filosofia, de certo não me considerava sortuda. Entretanto, tive momentos de paz, principalmente quando chovia pela manha e a tarde fazia um leve sol, deixando-a rosada, de ar fresco convidativo às borboletas. Em uma destas tardes eu passeava pelo jardim tão a só que por prazer recitei um verso de Platão:

- “Riqueza alguma proporcionará a paz para um homem ruim”.

Não estava sozinha, atrás de uma roseira havia um rapaz de aparentemente dezessete anos, estava aparando capim, sujo pela terra, porem perfumado pela mesma, era um jardineiro. Ele disse:

-O que disse senhora, é um verso de Platão?

-Sim, sabe quem fora ele?

O jardineiro, pensativo respondeu:

-Só que era um filósofo ateniense, discípulo de... Sócrates!

- Já é um bom conhecimento.

-Não o bastante, senhora.

Ele só dava presença nas sextas à tarde, eu passei a convidá-lo para um café e aulas informais de filosofia, ali mesmo no jardim, a conversa fazia-me sentir como uma adolescente, ainda não casada. Não pensar em problemas, admirar flores e desvendar os mistérios de Platão era maravilhoso. Meu deus é difícil lembrar o passado!

“Ainda não casada” quem sabe foi essa a ilusão que me levou ao adultério do desejo pelo jardineiro de olhos vezes verde; vezes caramelo. Luxuria inocente de adolescentes no jardim entre rosas, capins, hibiscos e cascos de coquinhos. Nada me tiraria a felicidade, pensava.

Antonio, em uma segunda à noite, chegou colérico da fabrica e disse:

- Teremos que voltar á Minas Gerais.

Meu corpo ficou passivo, minha mente reagiu entre impulsos de raiva e dúvida, não visível a ninguém, segundo os estudos de René Descartes. Antonio prosseguiu:

- O governo vai construir um conjunto de prédios para habitar pobres, o bairro ficara segregado. Venderei a fazenda antes de começar o caos. E você tente ajeitar tudo!

Só consegui dizer duas palavras:

-Quando vamos?

Ele sentou na poltrona e disse:

-Sexta à tarde.

Dayane de Sousa
Enviado por Dayane de Sousa em 16/07/2011
Reeditado em 16/07/2011
Código do texto: T3099117