A CHANCE
Madrugada fria e escura. Aquilo não podia ser verdade... Amanda nem acredita que o destino lhe trouxera até ali. Em passos apressados ela caminha em direção àquela pensão suburbana que era agora o seu lar, perdida em seus pensamentos. Não tinha mais a arrogância que lhe era peculiar até há quatro anos. Nessa época nada tinha valor para a adolescente rebelde, que sentia vergonha da casa e da própria família. Filha única de mulher, seus pais e seus dois irmãos de tudo faziam para que ela tivesse o que era comum às colegas do colégio caro, que com muito sacrifício era custeado pelo trabalho de todos.
Mas nada disso era importante para Amanda que seguindo o script das revistas especializadas, que para ter sucesso teria que buscar centros mais avançados, ela contraria toda a família e decide aos dezoito anos ir morar sozinha na capital e lutar pelo sonho de ser modelo e ter uma vida de glamour e riqueza.
Ela sabia que não ia ser fácil, apesar de muito bonita. Mas, sair daquele lugar pobre e interiorano e conviver com pessoas “civilizadas” era para Amanda mais do que motivo para arriscar-se nesta aventura. Pelo sonho irredutível ela rompe com a família e foge com o pouco de dinheiro que tinha e uma agenda de contatos do meio artístico.
Chega a São Paulo, cheia de planos, de esperanças e sem nada de conhecimento e bagagem. A princípio mora com umas amigas, conterrâneas que ela manteve contatos através do Orkut. Mas, sem trabalho e sem a condição de dividir as despesas, não deu pra ficar muito tempo.
Após várias frustrações em agências (lotadas de moças bonitas e qualificadas), falsas promessas e “cantadas” e nenhum resultado, ela se vê obrigada a trabalhar como caixa em uma grande rede de supermercados, sem perder a esperança de que era apenas por um período.
O tempo foi passando, nem mesmo a beleza conseguiu ficar ao seu lado. A vida sofrida, mal alimentada e noites mais dormidas deixavam Amanda distante da menina linda admirada pelos seus verdes olhos tão cobiçado na sua pequena cidade natal. A forma como saíra de casa e talvez o orgulho e temperamento forte, lhe impediam de dar notícias ou procurar saber de como estava a sua família que começava a lhe fazer muita falta.
Não podia se deixar ser vencida daquele jeito. Não era, definitivamente, o que tinha sonhado naquela cidade. Resolve então buscar uma última saída como forma dar a volta por cima e conseguir a vida que tanto imaginou, se não com o glamour, pelo menos agora com uma condição financeira que lhe desse uma vida mais digna.
O dinheiro veio, mas a vida digna ela descobriu que não era a condição de ter roupas boas, um carro ou uma bela casa. A forma como era tratada, as humilhações e o perigo a que era obrigada a conviver, era um preço alto demais. Tudo o que conquistara em oito meses como garota de programa foi descobrir que o bem material não compensava a dignidade que não sentia mais consigo, seus valores cristãos e toda a educação dada pela família, que agora lhe faziam sentido, mas, não era mais parte da vida que levava.
Amanda chega à pensão enxugando as lágrimas, pelos pensamentos que tanto lhe atormentavam ultimamente e percebe que na recepção as luzes e o barulho não eram de normalidade. Entra devagar e fica surpresa ao ver ali, seus pais e seus irmãos felizes ao lhe ver e de braços abertos para filha que por tanto tempo eles procuraram.