LAWRENCE DAS ARÁBIAS E UM CAUSO NO CINE POLITEAMA - LIA LÚCIA DE SÁ LEITÃO – 01/07/2011.
Outro dia uma amiga me chamou de ladinho e disse assim: li uns textos seus, o Sentimento do Caos mas porque tamanha tristeza se você é pra cima, feliz, cheia de energia, não deixa ninguém ficar triste e berra aos quatro cantos que a tristeza só deve ser valorizada quando é hora de voltar pra casa de táxi depois de uns tantos golinhos de vinho? Realmente, o texto é pesado, dolorido, sofrido, nem sei se postei no Recanto das Letras, mas o péssimo humor do caos passou. Por causa dessa observação resolvi evitar expor os textos mais pesados. Deixo as tranqueiras para o analista, afinal ele tem que gastar os neurônios para entender minha loucura textual. Falar em analista eita que a gente paga caro para alguém ouvir, ler, discutir as neuras, tudo seria tão facilmente resolvido numa mesinha de bar, boa música e sem alguns pares de olhos a filmarem dentro de um foco as projeções mais intimas possíveis sobre o pobre cristão solitário, cheio de silêncios, ali largado sem ao menos pensar na conta de energia ou no celular que finalmente emudeceu porque a bateria acabou.
Os que me conhecem sabem que da vida eu consigo filtrar o que é bom e o que é mau, sem as barbáries comuns nos bate papos, que é primordial se descartar o mau. Que nada, o mau também é bom na vida da gente! Analiso tudo bem certinho do é o mau para não meter mão em vespeiros. O que é bom é bom e é tão bom que nem dá para descrever!
Pois bem, vamos ao que interessa nesse momento! Tudo que eu escrever daqui para frente será fato inusitado, causos do cotidiano que a gente nem sabe o motivo do fiasco e da risadagem e assim, terminamos celebridades familiares.
Esse causo aconteceu em Natal, Capital do Rio Grande do Norte numa mostra de filme no Cine Politeama, tem história esse cinema como tantos outros Cines das capitais nordestinas que mantinham a classe e o luxo em suas salas, hoje infelizmente os nossos cinemas foram convertidos em igrejas que limitam o reino de Deus que é Universal em templos.
O Politeama foi inaugurado em grande estilo em dezembro de 1912. Ali a sétima arte era muito bem apresentada e representada em nome de uma sociedade que participava do lazer em ambientes distintos. A parte interna do Politeama possuía salões amplos e ricamente decorados com iluminação clássica, espelhos e lustres de cristal. A parte externa com jardins era outro ambiente. Lá estavam luxuosamente postas as mesinhas para um sorvete, uma gelada, chás, cafés, chocolates bolos e creio que não faltava o tradicionalíssimo quindim potiguar. Vale salientar que os antigos moradores falam dessa belle époque com nostalgia.
Com todo esse glamour a sociedade correspondia com sua presença refinada e de bons tons em clássicos como E o Vento Levou, Dr. Givago, A Noviça Rebelde, Dom Quixote de La Mancha e finalmente o nosso enfoque principal, Lawrence das Arábias.
Enfim, nos idos de 64 na fornalha da revolução que nunca houve, dois anos após o lançamento do filme Lawrence of Arabia, filme épico original em inglês baseia-se na obra de T. E. Lawrence, e em seu livro the best os Sete Pilares da Sabedoria, o filme explora a excentricidade, inteligência, elegância de Lawrence na Península Arábica. Verdadeiro opositor e combatente contra os turcos e aliado dos árabes quele que se mostrou um verdadeiro e destemido guerreiro da Coroa Inglesa nas areias do deserto.
O filme é dirigido por David Lean e vencedor em 1963 do Oscar nos EUA nas categorias de melhor filme, melhor diretor, melhor edição, melhor direção de arte a cores, melhor fotografia - a cores, melhor som e melhor trilha sonora.
Já legendado para o português e campeão de bilheteria, Lawrence das Arábias tornou-se também um clássico da sétima arte em Natal. A história do herói britânico que vivia pelejando (leiam guerreando), e vencendo como um beduíno valente não só as tempestades de areia como o verdadeiro deserto e o sol escaldante sem contar as contendas com os arqui-rivais os turcos otomanos.
Nesse momento também histórico para o nosso protagonista maior o Cine Politeama, numa tarde quente dos trópicos, um casal das terras sergipanas estavam ali em terra potiguar, enamorados, ele oficial do exército recém transferido e ela a mãe dedicada de três lindas e encantadoras crianças, ( depois de adulos: o do meio é psicólogo, meu terapeuta lembram? Uma fofoca à boca miuda, esse filho do meio foi quase padre mas, se perdeu quando coroinha, a mais velha uma ex noviça que largou os votos de castidade de esposa da Igreja para casar, hoje é escritora e professora de estirpe clássica e a terceira é palestrante e teóloga da Igreja Católica.
Para aquela família o sábado era sagrado como para toda a comunidade cristã de Natal que se concentrava em união e fé na Missa da Matriz Nossa Senhora da Apresentação, a Padroeira de Natal. Depois da obrigação, a diversão.
As crianças ficavam aos cuidados das babás e os pais saiam para o sorvete e finalmente o filme.
( PS - Eu e muita gente imagina que os Padroeiros de Natal são os Três reis Magos, engano Histórico.)
Assim, aconteceu com aquele jovem casal e outras tantas pessoas da sociedade, primeiro os compromissos com a Santa e Poderosa Madre Igreja depois os apegos e apelos pelo imaginário da sétima arte, ele o heroi, forte, dominador, inteligente, e respeitado pela patente do Exército e ela a mocinha sonhadora que suspirava de paixão pelo eloqüente e garboso artista.
Imagine caro leitor, o segredo das mulheres diante da beleza do ator e do lado um namorado, marido ou amigo nordestino, o ator alto, cheio de músculos, o companheiro baixinho, moreno, nem sempre cabeça chata, mas do tipo machão, sem muitos trejeitos de artista, sem muita demonstração de afetos em público a não ser o de varão domínador e protetor do sexo frágil.
A história real revela que o Lawrence, foi um oficial britânico, escritor, diplomata, espião, arqueólogo, que foi um dos principais mentores da independência da Arábia e levou aquela gente à vitória contra os turcos otomanos. Eita! o prato cheio para os sonhos mais que secretos da mulherada. Durante a fita, ouviam-se suspiros, pigarros. Algum leve, oh! Outro suspiro, e mais suspiros, um soar de nariz, e um casal se levanta de suas carteiras acochoadas e sai da sala de projeção.
Ele com o semblante contrariado, ela com os olhos inchados e vermelhos. Saíram do Politeama. Dirigiram-se mais que depressa para casa e lá ele tomou um colírio na farmacia doméstica e colocou nos olhos dela que ainda vermelhos e lacrimejantes. Aqueles olhos verdes holanda resistiam à cura do medicamento, a cada minuto mais e mais irritados pareciam que estavam contaminados por uma forte conjuntivite.
Ele intrigado, finalmente pergunta: querida o que aconteceu para tal situação? Ela responde com a voz fininha e meiga, meu amor foi aquele deserto e aquelas nuvens de poeira que me deixaram desencantada e desorientada, eu não podia prestar atenção ao filme, os olhos ardiam, sinceramente não deu tempo de esconder o rosto daquele areial que caiu todo em cima de mim.
“Todos os homens sonham, mas não da mesma forma. Os que sonham de noite, nos recessos poeirentos das suas mentes, acordam de manhã para verem que tudo, afinal, não passava de vaidade. Mas os que sonham acordados, esses são homens perigosos, pois realizam os seus sonhos de olhos abertos, tornando-os possíveis”. — T.E. Lawrence, Os Sete Pilares da Sabedoria.