A volta é sempre assim...
De repente, abro os olhos e vejo uma pequena barata andando sobre o piso de aço, ou ferro, ou seja lá do que for feito essa merda. De qualquer modo está imundo, a visão da barata dá um aspecto de estar especialmente imundo.
Definitivamente estou em um ônibus, não sei exatamente qual. Na verdade não faço a mínima idéia de qual seja a linha, ou onde peguei, ou pra onde ele vai... Puta que o pariu, minha cabeça tá me matando... Na verdade nem sei que porra de lugar é esse por onde estamos passando.
Não estou sozinho. Além de mim, mais três pessoas estão no ônibus. Uma negra, não muito velha, mas também nenhuma lolita, com peitos descomunalmente grandes se mostrando através de um decote tamanho tão fora do normal como as tetas em si, tanto que eu juro que aquilo ali é o bico do peito dela. Ela fala alto ao celular e gargalha e gesticula, como se estivesse conversando de frente pra pessoa. Curioso. Tem um outro pretinho, jovem, cara de bandido. Parece ter acabado de sair do Padre Severino, ou FEBEM, ou um nome desses, sei lá qual o nome daquela porra de fábrica de pivete hoje em dia. O outro, na cadeira do fundo, canto esquerdo, é um velho. Branquelo e feio, com a cara avermelhada e toda marcada por cicatrizes, lembrando muito o aspecto de areia mijada. Pelas roupas gastas e o cabelo sebento mal penteado pra trás, parece um mendigo, dormindo profundamente. Certamente bêbado, pois ao seu lado tem uma garrafa de vodka Natasha vazia. Talvez esteja morto.
O boca ressecada e o gosto de alcool com arroto na minha boca me faz desejar encontrar um camelô vendendo água mais do que achar uma pepita de ouro, mas pela janela, a paisagem continua não me dizendo nada, nem uma breve dica de onde caralhos eu estava. Poderia ser uma porrada de lugares onde a civilização ainda não chegou, que dirá camelôs, pois só tinha mato de um lado e outro. Talvez Campo Grande, Santa Cruz, talvez já nem fosse mais na cidade do Rio.
Mas confio no meu bom senso. Imagino que se entrei nesse ferro velho por vontade própria, certamente ele vai pro lugar certo, seja lá qual for o lugar certo. Claro que sempre existe a possibilidade de eu não ter entrado por vontade própria, mas prefiro não cogitar esse hipótese, pro meu próprio bem.
De qualquer modo, chego a conclusão de que o mais coerente a se fazer numa situação como essa é voltar a dormir. Em algum momento eu chego. Não sei quando, não sei onde. A volta é sempre assim. Se é que estou voltando.