Sou?

Eu sou um cara com uma caneta barata fabricada na China ou em Taiwan rabiscando um bloco que me custou um real, dentro de um ônibus indo pros subúrbios cariocas.

Sou um cara indo pro subúrbio. É isso que sou, pelo menos agora.

Tenho algumas garrafas de vinho no meu armário da cozinha, uma guitarra velha encostada na casa de um amigo, um cargo público de arquivista numa universidade do governo que não me deixa morrer de fome ao final do mês e uma cueca com o elástico solto e um furo na bunda.

Às vezes sou bêbado, às vezes onanista, às vezes um tarado, às vezes arquivista. Entre uma punheta depois de uma boa garrafa de vinho e um documento inútil catalogado que ninguém nunca vai consultar, escrevo um conto, ou um poema, ou uma catarse emocional qualquer com a velha caneta fabricada em um país oriental.

Não tenho muito o que fazer entre uma coisa e outra, então às vezes observo beija-flores batendo suas asas numa velocidade que as faz simplesmente desaparecer. Não sou um biólogo por isso.

Minha boa garrafa de vinho não me custou mais que cinco pratas. Apesar de algumas punhetas ocasionais, percebe-se logo que não sou nenhum enólogo.

Bem, ao menos, apesar da ameaça anual caso não pague o registro profissional, eu tenho um papel vistoso e com selo brilhante onde está escrito que sou um arquivista.

Mas meus contos e poemas, estes sem dúvida não me tornam mais um escritor que um bêbado em suas lamúrias.