INQUIETAÇÃO DAS FOLHAS
Tão logo cessou o calor do verão, o outono colou sua face na brisa - o suficiente para a inquietação de milhares de folhas.
Já era quase dia, quando uma delas com os olhos suplicantes e coração apertado me acordou e disse:
- Estou com muito medo.
- Medo do quê?
- Da hora do vento me levar.
- Não se preocupe, não sentirá dor. Apenas dançará no ar ao som do cântico dos anjos.
- Como sabe disso tudo, se você está sempre conosco?
- Também já tive esse mesmo medo. Depois, passei por muitas e muitas transformações. Agora que sou uma árvore, meu tempo fincado na terra tornou-se mais longo. A natureza extraiu vantagens e colou sua sabedoria em minha pele. E sei que por um período deverei ficar só. Meu tronco e galhos ficarão nus e para que eu não sinta muito frio voltarei para dentro de mim. Por esta razão devo me desprender de todas vocês.
- O que será de minha vida e das outras tantas folhas, sem você?
- O que o destino já tiver traçado. Com o sopro do vento você poderá voejar e apreciar toda a beleza do outono. Quando perder o fôlego, poderá cair nas mãos de uma criança e ela brincar por horas e horas com você. Ou ser colhida por um adulto, que a guardará como uma preciosidade em meio às folhas de um livro. No entanto, se cair na terra deverá virar mofo e gentilmente oferecer nutrientes para ela. Lembra-se de quando você era bem novinha e eu lhe contava a história do verde?
Do mofo à terra, da terra ao mofo - o processo da vida? Pois é, desta forma você seguirá o seu destino. Como vê, não será tão difícil assim.
- E você, como ficará sem nossa presença em seu corpo. Não sentirá muito frio?
- Sentirei frio sim, pois vocês cobrem o meu corpo e me protegem do vento. Mas seguirei minha sina... Devo passar pela dor de ser confundida com a morte. Muitos desconhecem que se trata tão somente do que aparenta ser. Ninguém nunca lhes disse que a vida se resguarda em minhas raízes para retornar mais forte.
É assim, na paciência, que aguardo o tempo e a sorte de florescer.