COTIDIÁRIO

Foi tudo muito rápido.

Dezinho contornou o muro com violência. Olhava pra trás. Tropeçou em dona Júlia, que vinha arrastando o passo pelo passeio. Caiu. Uma arma, negra e cintilante, o alcançou. Curumim a empunhava.

Não houve nenhum gesto. Dezinho, ainda caído, olhou para seu algoz. Piscava o olho incessantemente. Dona Júlia deu dois passos para trás. Quando ensaiava um grito, dois, três, quatro tiros ecoaram no ar. Desmaiou.

Curumim não piscava. Viu a massa que ululava ao lado do corpo inerte da velha. O olho esquerdo aberto. Enviesou as vistas e viu dois guris atrás do poste; Alaor, em seus seis anos ainda, e Jonas, já na casa dos nove. Sorriu sincero, de vitória. Os meninos também, de medo. Levantou a arma, soprou junto ao cano. Guardou-a na cintura. Saiu andando pela rua 10. Na passagem, alisou os cabelos crespos de Alaor.

(conto inédito, da série "Contos Crônicos", no prelo)