O impronunciável

No começo havia o silêncio, a calmaria total, sublime e absoluta. Uma sensação de quietude e paz que poderia durar toda a eternidade. Mas depois de mim, toda calmaria e toda quietude se tornariam apenas apreensão e suspense para o grande caos por vir. Todo momento de perplexidade e todo olhar perdido para o alto deixaria de ser pura contemplação e admiração para dar lugar ao pavoroso silêncio que precede o aparecimento do cogumelo luminoso nuclear no céu.

Depois de mim, toda ponte seria construída para ser queimada, todo corpo para ser mutilado e todo regime para ser derrubado. Todo rei seria coroado para ser decapitado, todo burocrata eleito para ser desacreditado e toda mulher formosa seria noiva para ser mal amada.

Eu venho de onde ninguém pode me ver, pois não tenho forma, credo, nem convicção. Não sou limitado por ideologias, sou caos e desobediência, sou revolta e digressão, sou aquele medo que palpita forte no coração culpado.

Mas me temem os que a mim devem, mesmo sem saber. E hoje, este grande aquário desconexo, incoerente e contraditório ao qual vocês chamam de lar, eu observo e aguardo. Muitos dizem que estou morto, mas estou apenas adormecido, “confortavelmente anestesiado” como a música do Pink Floyd, esperando pacientemente vocês baixarem a guarda.

E quando eu vir, não venho sozinho, nem enfraquecido. Venho como nunca vim antes, derrubando as máscaras e obliterando essa rede de hipocrisia em que as aranhas do poder envolveram tudo e todos. Aguardem, pois como pragas, pestes, gafanhotos e maldições, invadiremos suas plantações de indiferença e iremos descosturar os olhos de cada verme que vocês cegaram com suas fardas, discursos e títulos, para depois enforcar todos vocês em um grande evento de libertação dessa mediocridade, da estagnação, manipulação e alienação.

Diego Biagi
Enviado por Diego Biagi em 27/05/2011
Código do texto: T2997540
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