PriorIdades
Faz tempo que deixei de ir a shows. Não sei se foi uma evolução ou um retrocesso, mas o fato é que gradualmente passei a me sentir cada vez mais peixe fora d’água, mais observador dos que se divertiam ao redor que propriamente alguém disposto a se divertir com aquela bagunça toda. Talvez a velhice seja isso: saímos do palco enquanto atores mais novos repetem os nossos papéis e nos contentamos em assistir o teatro da vida lá da plateia. Lembro que costumava sair com uma turma grande de amigos. Havia os porres, as brigas, as transas e as ressacas homéricas. Com o tempo a disposição diminuiu, a turma se espalhou, as saídas escassearam, a vontade cessou. Nas lembranças ficaram os companheiros de porre, a insuperável Luanna, a pudinzinho de pinga, que sempre acabava eu ou ela apoiando o porre do outro. O menos mal socorria o outro levando para casa, tentando convencer os pais que faziam cara que acreditavam que aquele vômito todo era por causa de uma mera coxinha estragada. À noite, com as luzes apagadas, lembro dela chegar pé ante pé até mim e sussurrar que tava muito mal e perguntar como eu estava. Se aconchegava em mim e acabávamos dormindo depois de rir das besteiras que tínhamos feito ou visto o outro fazer. O último show no qual fui foi em consideração a um amigo das antigas. O cara montou uma banda e me presenteou com um ingresso. A Luanna também estava lá com o marido. Trocamos olhares nostálgicos, que silenciosamente relembravam bons momentos. Acho que ela continuou com o mesmo pique nos shows, eu é que em algum momento perdi o interesse.