O MENINO

O MENINO

Era inverno. Aquela noite estava extremamente fria. O céu, magnífico, sem nuvens e uma lua prateada que dava vontade de parar e ficar admirando. Foi quando vi o Hélio sentado na calçada. Chorava copiosamente. Apesar do frio intenso, ele trajava apenas um calção verde, surrado, usado já há uns dois anos a contar pela aparência. Podia-se ver uns furinhos, o que denunciava sua idade. Ele estava todo encolhido, com os braços apertados sobre o corpo magro e aparentemente mal nutrido. Aproximei-me.

__ E aí garoto? Que está fazendo sentado nesta calçada? Não está com frio?

__ Sim, muito.

__ Você mora nessa casa?

__Não, moro ali naquela do meio - respondeu apontando-me a casa com a cabeça.

Voltei meu olhar para a casa. Era pequena, bem simples, de um telhado antigo e uma pintura amarelada e gasta. Lembrou a casa onde eu morava quando era criança. As luzes estavam todas apagadas e parecia que ninguém lá estava acordado. Afinal, já era bem tarde. Fitei por uns instantes aquela construção e como um filme, de relance, rápido, fiquei ali agachado ao lado de Hélio em silêncio a contemplar aquele ambiente melancólico recordando rapidamente cenas de minha infância, numa rua de terra como aquela, com casinhas simples e silenciosas nas noites.

__ Porque está chorando? Sua mãe lhe deu uns tapas? Ou foi seu pai?

__ Não moço. Pai eu não tenho não. Ele morreu quando eu era ainda criancinha, quando trabalhava. Ele caiu de um prédio. Minha mãe nem sabe que eu saí. Ela não viu. Antes de dormir ela me deu um beijo, desejou boa noite e não lembrou de mais nada.

__ Mas filho, sua mãe lhe ama! Ela lhe beijou antes de dormir. Isso é carinho... E porque você está chorando?

Ele levou as pequenas mãos frias aos olhos e enxugou as lágrimas que caíam do seu rosto e me disse entre soluços:

__ Não moço. Ela falou que eu teria uma surpresa esses dias. Eu pensei que hoje eu ia ganhar minha bicicleta. Esse é meu sonho e mamãe não lembrou.

__ Vai ver ela não conseguiu ainda comprar. Mas ela vai lhe dar, tenho certeza.

__ Vai não moço. O Dinho ganhou mês passado a bola que ele tanto queria. Noite passada eu nem dormi. Fiquei pensando que ia acordar cedinho antes de ir para a escola e a bicicleta estaria lá, toda linda. Mas não estava. Mamãe poderia ao menos ter falado que não ia me comprar a bicicleta.

__ Fica triste não! Vai pra casa dormir e se aquecer. Tenho certeza que ela só devia estar muito atarefada hoje e não teve tempo de comprar. Espera mais um pouquinho.

__ Se fosse teria me dado hoje moço. Nem mamãe lembrou. Hoje eu estou fazendo oito anos.

LUCAS FERREIRA MG
Enviado por LUCAS FERREIRA MG em 16/05/2011
Código do texto: T2973547
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