A foto de uma sonho
A coisa é crua, um tempo expandido e solitário, amarelo-roseo. Ela sentada, sentadinha no velho sofá de napa ,forrado com lençol de retalho. Queria que tomasse logo o chá oferecido por ela. Dessa vez pouco, menos enjoado. A agulha bailava em sua mãos enquanto a tolha crescia na sua construção. Dava uma risadinha de canto, outra hora, a boca apenas esticava, mostrando que os pensamentos possuíam seu corpo, e esse respondia a eles, sem se preocupar com olhos que lhe iluminava. Dentro desse quadro onírico, de chá e lembranças, seu vestido grande e florido arrastava no chão escondendo seus pezinhos na velha chinela de couro.
Do outro lado de mim, lado de fora, pra ser mais exato, na rua, acima no céu, uma lua grande e vermelha, clareia a rua, que sem energia elétrica, assoma ao ambiente da gente, que é feito de candeeiros a querosene. Vários deles, em cada canto, uns cinco, cheiroso de calor, que faz o retrato dela, também aromado.
Pergunto a ela varias coisas, de sua vida, da rua, de quando criança. Ela conta historias, muitas de infância, dos mortos, muitos morreram. Ela é velha, viveu muito, viu muitos deixar a vida. Ela conta. Tem prazer e saudade. Olhinhos brilham, chora um pouco. Eu choro também, mas sem ela perceber. Não quero que ela pare. Quero que ela entre na vastidão de seu mundo. Na grandeza infinita de tudo que viu. Enquanto me contava, me lembro das letras. De suas historias se tranformando num conto. Numa nova vida no papel. Me afastava um pouco dela com isso. Eu voltava, ela percebia, sutil, percebia, e seus olhos voltava pra mim. Agradecia. Oferecia mais chá, mais quente dessa vez.
Continuei olhando, esse mundo imaginário que se dá nos encontros sinceros. Tomei muito chá, ri. E vez ou outra procurava a lua atrás de mim, que mostrava também ouvir.