A MULHER QUE VIROU PEIXE SEREIA - LIA LÚCIA DE SÁ LEITÃO 2/05/2011

Caríssimos. o inusitado fato aconteceu num bairro da periferia de Olinda, Pernambuco, e bem longe do mar, porém próximo a um córrego entulhado de garrafas de refrigerante e sacolas plásticas, esgotos e entulheiras de lixo domésticos.

Tudo parece bem decrépto não é? Pois bem,em meio ao caos ainda se pode fazer alusão ao romantico maravilhoso, criar e recriar lendas, reconstruir o discurso já por tanto tempo invariável.

Que graça tem falar da Iara e de seu igarapé se bem próximo os garimpeiros destruiram meio mundo de selva?

Os índios antes livres, leves e soltos andam com a Bíblia debaixo do paletó, e se cumprimentam em inglês?

A nossa protagonista é a mulher que virou peixe, e sua história é interessante, urbana, perua que ocupava cargo público pelo velho e tradicional cabide de vereador. Vamos lá sem o tradicional senso e comum ... era uma vez.

Os dias de chuva em Olinda transforma a cidade, alagando as ruas e avenidas, tanto pela frente quanto pelos fundos, explico: pela orla com um mar verde esmeralda quebrando nas pedras dos arrecifes inspirando os muitos artistas da cidade a olharem a cidade nos seus vários ângulos inspira um certo receio, água limpa escondendo toneladas de coliformes fecais, como merda assusta menos que tubarão, as placas na orla não indicam poluição indicam cuidado! tubarões.

Não menos diferente a periferia também sofre seus apertos. Possuindo um mar de águas empoçadas, galerias entupidas o escoamento das águas pluviais seguem um curso sem barquinhos de papel para o Rio Beberibe, morto pela poluição assim como os córregos e canais negros que nele desaguam.

A lavadeira de roupa perdeu espaço para as garrafas de refrigerantes, caro leitor pensou que eu ia falar nas máquinas de lavar anunciadas na TV? Não! Refiro-me aquelas lavadeiras que batiam as peças de roupa nas pedras, cantando as modinhas típicas da região, depois entendiam-se nos varais peças e peças que mais pareciam bandeirolas.

Pensando bem, o homem matou o rio e o rio envenenou os seus peixes e agora se mantém como depósito de recicláveis, o pescador de peixes de água doce tornou-se o catador de latas de cervejas para reciclar, uma nova fonte de renda surge do caos.

Mas, a mulher que virou peixe ainda não está inclusa nessa história, é necessário que se mostre uma pequena parte do cenário para ela poder brilhar plenamente como protagonista.

O povo daquelas cercanias passou a se utilizar dos programas de televisão e os grandes jornalistas sensacionalistas mostravam a cru aquela realidade, o IBOP foi tamanho que uma rede privilegiada de TV marcou até uma agenda de promessas das Secretarias disso e daquilo, eu nunca sei se meio ambiente, se administração, estrutura, se defesa civil, ou sei lá! São tantas as secretarias com tantos doutores para defesa da população que já perdi as contas, pra quem esqueceu apesar de escrever também sou povão.

A população naquele dia estava indignada com as águas acumuladas pelas ruas e poças mais pareciam rios de lixos a e entulhos, as crianças se divertiam, já estavam mesmo de barriga d´água, lombrigas, sarnas, perebas um mergulho a mais ou a menos não ia afastar a catarreira verde que descia do nariz e obviamente sugado a cada respiração.

As mulheres prenhes com seus ainda pequenos no colo sugando-lhes os seios entrelaçando as pernas finas e desnutridas por cima de uma barriga enorme e pontuda. Os homens com pás, enxadas, carros de mão, baldes, punhos cerrados como grito de revolta, queremos um responsável da Secretaria aqui, venham ver que miséria vivemos, mas pagamos impostos, pagamos isso e aquilo, fiquei olhando é tanto pagamento que dava para curar a rua daqueles buracos entupidos que mais pareciam cataporas à pururuca.

Redes de televisão chegaram e cada uma com seus repórteres fantasiados de enchente, capas, botas e uma espécie de capacete, verdadeiros ETÊCENTRICOS (neologismos criado por mim agora), e haja falação depois lá estão brigando por espaço duas emissoras, pareciam que não sabiam que tinha lixo, entupimento, doenças para todos e ainda sobrava meio quilo para cada um dos secretários de governo.

Finalmente, para um carrão do governo, a porta se abre, primeiro as pernas, mas só se via o solto quinze e a meia cor da pele da mulher, ela num impulso de celebridade fica em pé, ajeito os óculos rayban no rosto, olha o povaréu por cima e faz sinal para os repórteres televisivos que dará uma entrevista logo após a vistoria pelo bairro. A mulher segue em passos firmes, mas parecia um coronel da milícia Italiana, sua roupa branca impecável fica com a barra das pernas das calças pretas de lama, mas ela estava ali pelo povo e para o povo, atravessou a rua e gritaram em uma só voz cuidado! A senhora vai cair! E a mulher caiu realmente, torceu opá, desequilibrou e despencou na pirambeira, rebolou de margem abaixo e mergulhou no Beberibe o mesmo rio fétido que corta a periferia de Olinda e Recife, a meninada tomada de espanto e alegria , megulhou atrás fazendo o maior panavueiro, as lavadeiras de máquina agora se deleitavam de rir pois teriam que passar semanas para tirar toda aquela sujeira da roupa da mulher, os catadores de latinha de aluminio ficaram confusos, pensativos, e se questionavam, o rio morreu, os peixes desapareceram restou agora a mulher que virou peixesereia das águas escuras do rio.

Assim nasceu a mulher que virou peixe sem delongas a historia acabou.

Lia Lúcia de Sá Leitão
Enviado por Lia Lúcia de Sá Leitão em 02/05/2011
Reeditado em 11/02/2012
Código do texto: T2944313
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