Romance

Casei-a numa pacata igrejinha. Uma cerimônia pequena, sem muito alarde e pra poucos convidados. O vestido que ela usava era o mesmo que o de sua mãe. No altar, Alberto dispunha-se pomposo, enquanto sorria.

O homem por quem a fiz lutar por quase todo um ano deveria estar ali. O triunfo completo da paixão que a fez abrir mão da própria vida. Chegamos ao clímax.

A lua-de-mel seria em Paris. Seu sonho mais íntimo. Encarreguei-me que Alberto a satisfizesse em sua mais perversa volúpia durante as núpcias. Eu a tornei a mulher mais feliz do mundo. Se não é o Gran Finale...

Mas o fim me incomoda. Olhando para Alberto mais adentro, vejo que não passa de pura superfície. É insosso e oportunista. Não, ele não a merece.

Ela é cria minha. Eu me preocupei em fazê-la mulher e esmiuçá-la. Não houve dia em que eu não a desejasse. Que não me doesse descrevê-la. Ela é o que de melhor há dentro de mim. É minha única virtude. Torná-la real tem sido minha mais desvairada obsessão nestes últimos tempos.

Não vejo graça em cedê-la, simplesmente. Ela é a melhor lembrança de mim quando amei uma mulher. A soma incalculável de todos os telefonemas não retornados, as cartas que nunca foram respondidas, todas as horas em que me policiei tentando não me lembrar da maneira com que o frescor de sua existência me afetava... Um anseio que me custou a sobriedade.

Aquela mulher tinha de ser minha. Minha!

Vou me inventar nas entrelinhas. A atitude mais sensata. Afinal, disponho de meios, e não há reviravolta que não instigue o leitor.

Invado a trama como que um novo personagem. Chego rompendo toda a solenidade. A bordo de um cavalo branco, traje real e tudo mais. Ornado na fantasia mais apropriada. A que inconscientemente espreita a todo coração feminino. O deslumbramento dela é evidente. Tenho como função raptá-la. Assim frustro Alberto. Que desamparado atira-se da Pont Neuf. Pobre!

A princípio ela reluta em se entregar a mim, mas me anuncio como seu único e verdadeiro amor. Declamo seu soneto favorito, canto todas as cores que sua alma possui, lhe beijo ardentemente. E por fim lhe prometo um amor de amante. Uma chama intensa e avassaladora. Todo dia fomentada. Não restam mais dúvidas quanto à veracidade de minhas palavras. Ela crê nelas e em mim. Finalmente, ela cede.

Satisfeito com o final e sob enorme êxtase, eu parto para a dedicatória:

“Á Célia, que só pude amar na ficção!”

Luiz Brener
Enviado por Luiz Brener em 01/05/2011
Reeditado em 06/05/2011
Código do texto: T2942172
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